Apenas 24% confiam nas Forças Armadas, em meio a denúncias contra 23 militares
Apenas 24% confiam nas Forças Armadas, em meio a denúncias contra 23 militares
Desde 2023, a confiança tem sofrido declínio, reflexo do cenário de polarização política e episódios envolvendo a atuação golpista de militares ligados a Jair Bolsonaro.
Publicado pelo Portal Vermelho
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Uma pesquisa recente do Instituto Atlas, encomendada pela CNN Brasil, revela que somente 24% dos entrevistados confiam nas Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica –, enquanto 72% expressam desconfiança. Dos 817 entrevistados, a amostra, calibrada para representar a população adulta do país, apontou uma queda significativa na credibilidade da instituição, que já alcançara seu auge de confiança em abril de 2023, com 46% dos brasileiros depositando fé nas Forças.
A pesquisa é divulgada em meio ao anúncio da Procuradoria-Geral da República (PGR), que denunciou nesta terça-feira (18) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas por crimes contra a democracia, 23 delas sendo militares. A acusação, formalizada ao Supremo Tribunal Federal (STF), inclui tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de Direito, organização criminosa e dano qualificado ao patrimônio da União.
Andrei Roman, CEO da AtlasIntel, destaca que “durante o governo de Jair Bolsonaro houve uma polarização acentuada na imagem das Forças Armadas”. Segundo Roman, os bolsonaristas inicialmente enalteciam os militares, mas a narrativa sofreu uma reviravolta com os acontecimentos de 2023.
A lista dos denunciados inclui 23 militares das Forças Armadas —7 deles são oficiais-generais (confira lista ao final). Somente a Aeronáutica não teve acusados.
Episódios que abalaram a credibilidade
A partir de janeiro, com o início das investigações sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado – articulada por Bolsonaro, segundo o ex-ajudante de ordens tenente-coronel Mauro Cid – a imagem das Forças começou a se deteriorar. Em meio a repercussão sobre a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes retirou o sigilo da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente entre 2019 e 2022.
Com esta decisão, espera-se que todo o conteúdo revelado por Cid venha a público ainda nesta quarta (19). O material reúne informações, já de conhecimento público, de que Bolsonaro e seu entorno tinham conhecimento sobre a trama golpista que levaram aos acontecimentos de 8 de Janeiro, além de outros crimes como o da falsificação de carteira de vacinação e de venda de joias da Arábia Saudita.
O episódio ganhou contornos dramáticos: enquanto o general Marco Antônio Freire Gomes, então comandante do Exército, teria recusado a adesão ao golpe, outros nomes, como o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto e o ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, foram implicados em tramas golpistas. Mesmo com as negativas dos envolvidos, tais denúncias contribuíram para que a confiança dos brasileiros nas Forças Armadas caísse de 46% para 24% em menos de um ano.
Além da delação de Mauro Cid, outros incidentes também pesaram na percepção pública. Um exemplo emblemático foi o vídeo institucional divulgado pela Marinha em dezembro, que comparava as supostas privações enfrentadas pelos militares à vida “tranquila” dos civis. O episódio gerou revolta ao revelar, ainda, discrepâncias salariais – como o caso do irmão do chefe do departamento responsável pelo vídeo, que recebia um valor líquido elevado em dólares – e serviu para acentuar a desconfiança na gestão e nos privilégios das Forças.
Uma crise institucional mais ampla
Os dados apontam que a polarização política agravou a crise de credibilidade das Forças Armadas. Enquanto os eleitores de Bolsonaro passaram a descrever os militares com termos cada vez mais negativos, aqueles que apoiam o atual governo de Lula mantêm uma opinião relativamente estável. No entanto, a percepção negativa cresce também entre os eleitores que votaram branco ou nulo, sinalizando um ceticismo generalizado que ultrapassa as linhas partidárias.
Essa desconfiança não afeta apenas a imagem dos militares, mas insere as Forças Armadas em um debate mais amplo sobre a representatividade e a legitimidade das instituições no país. Num contexto em que o Congresso Nacional figura como a instituição mais desacreditada, os militares enfrentam o desafio de reconstruir sua imagem, demonstrando comprometimento com a democracia e distanciando-se de qualquer associação com práticas autoritárias ou com tentativas de golpe.
A vinculação de militares a Jair Bolsonaro e a revelação de uma trama golpista não são incidentes isolados, mas parte de um processo que vem corroendo a confiança dos brasileiros nas Forças Armadas. Em meio a uma crise institucional e à polarização política, a tarefa de reconquistar a credibilidade popular se mostra urgente – tanto para restabelecer a imagem da instituição quanto para garantir a estabilidade democrática do país. Enquanto isso, o caminho para a recuperação passa, inevitavelmente, pela transparência, pelo distanciamento de práticas golpistas e por um firme compromisso com os valores democráticos.
A denúncia da PGR estrutura os acusados em diferentes núcleos. Veja abaixo os nomes ligados às Forças Armadas:
- Liderança política:
- Walter Braga Netto (general, ex-ministro da Defesa e candidato a vice-presidente em 2022)
- Militares de alta patente:
- Augusto Heleno (ex-ministro do GSI e general da reserva do Exército)
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa e general do Exército)
- Almir Garnier (ex-comandante da Marinha e almirante de esquadra)
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira (ex-chefe do Comando de Operações Terrestres, general do Exército)
- Mário Fernandes (ex-secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, general do Exército)
- Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel do Exército, atualmente preso)
- Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel do Exército, atualmente preso)
- Guilherme Marques de Almeida (tenente-coronel do Exército e ex-comandante do 1º Batalhão de Operações Psicológicas)
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro)
- Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel do Exército)
- Nilton Diniz Rodrigues (general do Exército)
- Forças de segurança e aliados:
- Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel do Exército, conhecido como “kid preto”)
- Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército, chefe de gabinete de Mário Fernandes)
- Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel do Exército)
- Ailton Gonçalves Moraes Barros (capitão reformado do Exército)
- Giancarlo Gomes Rodrigues (subtenente do Exército)