Decisão de Barroso sobre câmeras corporais é mais uma derrota para Tarcísio
Decisão de Barroso sobre câmeras corporais é mais uma derrota para Tarcísio
Ministro do STF diz que equipamento deve gravar continuamente. Determinação é mais um elemento na crise da segurança, decorrente da alta truculência e letalidade da PM-SP
Publicado pelo portal Vermelho
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) sofreu mais uma derrota nesta segunda-feira (9) com a decisão, tomada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, que determinou o uso obrigatório de câmeras por policiais militares em operações no estado de São Paulo.
Na decisão, resultante de pedido feito pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o ministrou estabeleceu a manutenção do modelo de câmeras de gravação ininterrupta.
“No caso concreto, entendo que, diante do agravamento dos episódios de violência policial e da persistência de denúncias de abuso, incluindo o mau uso da câmera, não se pode admitir, por ora, a implementação das câmeras com novo protocolo de acionamento, especialmente quando as funcionalidades ainda não foram suficientemente desenvolvidas nem testadas”, argumentou o ministro.
Barroso também enfatizou que “as câmeras têm o potencial de resguardar direitos, prevenir abusos e promover confiança nas instituições públicas”.
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Ele completou anotando que “o desmonte dessa política, sem fundamentação baseada em evidências sólidas, afronta os avanços já conquistados. Por isso, para uma transição segura entre os modelos, à luz do princípio da vedação ao retrocesso, seria recomendável que a substituição das câmeras de gravação ininterrupta se desse após a redução dos índices de letalidade policial”.
Conforme lembra o próprio ministro, de acordo com o Instituto Sou da Paz, a letalidade policial em SP aumentou 78,5% entre janeiro e agosto de 2024, em comparação com o mesmo período de 2023. No total, foram registradas 441 mortes nos primeiros oito meses do ano, contra 247 no mesmo período do ano anterior.
E, segundo o Ministério Público de São Paulo, entre 2022 e 2024, as mortes perpetradas por PMs cresceu 98%, saltando de 355 para 702 mortes.
Transparência e controle
Além desses apontamentos, o ministro Luís Roberto Barroso determinou que devem ser fornecidas informações sobre os processos disciplinares por descumprimento do uso das câmeras corporais; e a apresentação mensal de relatórios pelo governo de São Paulo sobre o andamento das medidas.
O ministro decidiu, ainda, que o governo deve definir uma ordem de adoção de novas câmeras a partir de uma análise do risco de letalidade policial; a divulgação de dados no portal da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo; e a recomposição do número total de câmeras para o mínimo de 10.125 equipamentos em operação.
Em sua decisão, Barroso destacou que “o não cumprimento reiterado dos deveres de transparência e monitoramento [do uso das câmeras] fragiliza a execução de uma política pública de alto impacto, cuja efetividade depende diretamente de supervisão e fiscalização, agravando o cenário de risco à ordem e segurança públicas”.
Segundo a Defensoria Pública, 48,3% das requisições de imagens de câmeras corporais, realizadas entre julho e novembro de 2024, não foram respondidas de forma adequada pela PMESP (Polícia Militar do Estado de São Paulo).
Desgaste
A decisão se soma a uma série de percalços que vêm sendo enfrentados pelo governo paulista devido à política de segurança adotada por Tarcísio e Derrite que, direta ou indiretamente, estimula o uso da violência desmedida e arbitrária pela PM, o que vem aumentando sensivelmente os casos de ações truculentas de policiais contra civis e na alta letalidade policial.
Embora os eleitores e apoiadores de Tarcísio e Derrite sejam, em boa medida, alinhados ao bolsonarismo — e, portanto, vêem com bons olhos a necropolítica da extrema-direita —, a sequência de casos de violência envolvendo a ação policial vem criando desgastes para o governo de SP.
Não à toa — e não por uma tomada repentina de consciência sobre o que vem ocorrendo — na semana passada Tarcísio disse que errou quanto à posição que tinha, contrária ao uso de câmeras corporais.
Na quarta-feira passada, diante dos casos em que um PM jogou um rapaz de cima de uma ponte e de outro que matou um homem com 11 tiros pelas costas, Tarcísio disse que não demitiria Derrite. Ainda assim, a situação do secretário, ao que parece, não anda boa.
Conforme noticiou pouco depois a jornalista Raquel Landim, do UOL, “Tarcísio chegou a admitir a interlocutores em conversas reservadas que o secretário ‘perdeu o controle’ da tropa e está muito insatisfeito com a situação”, mas que dificilmente o demitiria agora para “não passar recibo”.
Ainda segundo a colunista, o próprio Derrite, por sua vez, teria sentido o baque e tomado medidas para tentar melhorar a sua imagem — entre as quais orientar o comandante-geral da PM, coronel Cássio Araújo de Freitas, a dar diversas entrevistas e o apoio público de outro bolsonarista, o senador Ciro Nogueira, presidente do PP e padrinho político de Derrite.
Histórico
Em abril deste ano, o governo de São Paulo se comprometeu com o STF a usar câmeras corporais em operações policiais no estado e apresentou cronograma que estabelecia a implementação do sistema, inclusive licitação para a aquisição de novas câmeras.
Um mês depois, em maio, a Defensoria Pública de São Paulo pediu ao STF mudanças no edital da compra. Pelas regras do edital, o acionamento do equipamento de gravação poderia ser feito pelo próprio policial ou por uma central de operações. Dessa forma, a gravação poderia ser interrompida durante as operações.
No mês seguinte, Barroso indeferiu o pedido, mas decidiu que o governo de São Paulo deveria seguir os parâmetros do Ministério da Justiça e Segurança Pública na licitação para compra de câmeras corporais. Em setembro, o governo anunciou a assinatura de contrato com a empresa Motorola para a compra de 12 mil câmeras corporais, mas sem gravação ininterrupta.
Pouco depois, a Defensoria Pública pediu a Barroso a reconsideração da decisão, o que resultou na decisão desta segunda-feira (9).
Com agências