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Mercedes-Benz é punida por crimes de assédio e discriminação

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Mercedes-Benz é punida por crimes de assédio e discriminação

 

TRT condena empresa a pagar R$ 40 milhões após MPT denunciar xingamentos e humilhações contra trabalhadores da montadora em Campinas

 

Foto: FEM-CUT/SP/Divulgação

O cometimento dos crimes de discriminação e assédio moral contra trabalhadores levou a montadora Mercedes-Benz, em Campinas (SP), a ser condenada a pagar R$ 40 milhões em uma ação de dano moral coletivo. A decisão foi tomada, por unanimidade, pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15), segunda instância dessa esfera judiciária, na sexta-feira (4).

O colegiado ainda impôs à empresa multa de R$ 100 mil por dia em caso de descumprimento das medidas estabelecidas, a cada trabalhador vítima de assédio ou discriminação, ou multa diária de R$ 10 mil, a depender do item não cumprido.

De acordo com o Ministério Público do Trabalho da 15ª Região — responsável pelo ajuizamento da ação — existem mais de 12 obrigações que devem ser tomadas pela montadora. Dentre elas estão: o fim das práticas de assédio moral, especialmente contra os trabalhadores reabilitados; a elaboração de programas internos de prevenção ao assédio e discriminação (diagnóstico do ambiente de trabalho, adoção de estratégias de intervenção, treinamentos, palestras etc.); instituição de processos de mediação e acompanhamento da conduta dos assediadores; implementação de normas de conduta e de uma ouvidoria interna para tratar os casos de assédio, dentre outras.

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A ação civil pública foi movida a partir de investigação do MPT feita após o recebimento de denúncia encaminhada pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e Região, de que trabalhadores que sofreram lesões em decorrência do trabalho estavam sendo isolados dentro da fábrica durante o seu processo de reabilitação, e expostos a situações vexatórias e humilhantes. Também foram relatados nos autos casos de discriminação racial.

Na avaliação de Maicon Michel Vasconcelos, trabalhador na Mercedes e secretário de Relações Internacionais da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM), “não podemos deixar que esse tipo de prática se consolide pelo país. Por isso é importante que os sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras acompanhem de perto esses processos, principalmente em relação ao assédio”.

“Vagabundos”

Conforme informou o MPT, uma das situações se refere ao isolamento desses trabalhadores em setores onde ficaram submetidos a uma inatividade forçada, ou seja, permaneceram durante toda a jornada de trabalho sem executar qualquer tipo de atividade. Além disso, os reabilitados são impedidos de participar de eventos com a presença dos demais empregados e deixam de concorrer a cargos mais elevados dentro da empresa.

Ainda de acordo com o MPT, “a situação em questão gerava atritos com os demais colegas e com as chefias imediatas, que os chamavam de ‘vagabundos’, ‘preguiçosos’ e ‘ruins de serviço’. Um dos empregados, que possui lesão na coluna, informou ao MPT que, devido às medicações e às restrições na prática de exercícios físicos, ganhou peso ao longo do tempo. Os próprios profissionais do departamento médico da empresa afirmaram que ele havia contraído a lesão na coluna por ser ‘gordo’ e ‘barrigudo’”.

Mas, os absurdos vão além. O MPT aponta ainda, que um dos chefes do trabalhador lesionado teria afirmado que gostaria de acertá-lo com uma ’12′ (arma de fogo), e um outro metalúrgico, portador de diabetes, chegou a urinar nas calças porque foi impedido pelo chefe de ir ao banheiro; seu apelido passou a ser ‘mijão’”.

Também foram relatados nos autos casos de discriminação racial. “Um dos gerentes da fábrica disse a um dos trabalhadores reabilitados, de raça negra, que não conseguiria ir para os Estados Unidos por conta da cor da sua pele. Um outro empregado foi chamado de ‘macaco filho da p***’ pelo chefe após denunciar ao setor de compliance da empresa os casos de assédio moral contra reabilitados”, salienta o MPT.

Decisão do TRT-15

A decisão tomada pelo TRT-15 mudou a que fora tomada em primeira instância pela 12ª Vara do Trabalho de Campinas, que havia julgado os pedidos improcedentes.

No acórdão que reforma a sentença original, o relator, desembargador Luís Henrique Rafael, afirmou que “o Ministério Público do Trabalho descreve a identificação de linha cronológica do tratamento dispensado aos trabalhadores adoecidos a partir dos depoimentos testemunhais: num primeiro plano, os trabalhadores são vítimas de isolamento, até mesmo físico, sendo subtraídos de oportunidades de ascensão profissional, de acréscimos remuneratórios, de promoções, ficando alocados num ‘Grupo de Divergentes’, ‘congelados’ dentro da estrutura organizacional da empresa”.

Para o magistrado,  “verifica-se no comportamento reiterado da recorrida e seus prepostos verdadeiro culto ao ‘capacitismo’, pretendendo estabelecer quais são os corpos adequados e suas possibilidades, assim como quais não são. Ressalta-se que referidas práticas revelam, inclusive, conduta tipificada no Art. 88 da Lei nº 13.146/2015, que reconhece como crime a discriminação em razão da deficiência”.

Ele continua argumentando que “aceitar as práticas incontroversamente realizadas como ‘fatos isolados’, como defende a empresa, representaria grave retrocesso social que obstaculizaria as garantias constitucionais aos direitos da pessoa com deficiência”.

A empresa ainda pode recorrer ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).