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Debate destaca intersecção entre literatura e democracia

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Debate destaca intersecção entre literatura e democracia

 

Autores ainda falaram sobre a censura sofrida pela obra Avesso da Pele, de Jeferson Tenório

 

Foto: Fernando Udo

Nesta sexta (22), o Festival Vermelho recebeu uma roda de conversa especialmente marcante, que trouxe à tona reflexões sobre o papel da literatura no contexto democrático contemporâneo. Sob o tema “Literatura e Democracia”, o evento contou com a participação de três vozes proeminentes: as escritoras Cida Pedrosa e Conceição Evaristo, e o escritor Geovani Martins. A mesa contou com a intermediação da deputada estadual Olívia Santana (PCdoB-BA).

Durante o evento, a ganhadora do Prêmio Jabuti, Cida Pedrosa, poetisa, escritora e ativista cultural, trouxe à discussão sua experiência na interseção entre literatura e política. Seus trabalhos frequentemente abordam questões sociais e políticas, destacando-se por uma poesia visceral que ecoa as vozes marginalizadas. Cida enfatizou a importância da literatura como uma ferramenta de resistência e transformação social, capaz de desafiar estruturas de poder e amplificar as vozes daqueles que são marginalizados.

“A minha obra é atravessada por aquilo que alguns chamam de política social. Eu não escrevo porque só é lindo escrever. Eu escrevo porque também é necessário, mas porque eu quero afetar, de alguma forma, o mundo, as pessoas”, afirmou Cida. “E a literatura sempre foi pra mim instrumento de luta e, ao ser instrumento de luta, ela é instrumento da democracia”, continua.

Por sua vez, Conceição Evaristo, escritora afro-brasileira, premiada pelo Jabuti de Literatura, trouxe sua perspectiva enraizada em suas experiências. Com uma obra que mergulha nas profundezas da experiência negra no Brasil, Conceição ressaltou como a literatura pode ser um instrumento de empoderamento e de reconhecimento de identidades historicamente silenciadas. Sua presença na roda de conversa foi um lembrete da necessidade de diversidade e representatividade no cenário literário.

“A democracia aparece na minha obra quando pronuncio que é profundamente marcada pela minha experiência de mulher negra na sociedade brasileira. Nessa condição, estamos sempre nessa situação de nos impor, de nos colocar nesse espaço que se diz democrático, que elege determinadas pessoas. Trazer essas personagens é justamente afirmar esse espaço democrático no campo da ficção profundamente marcada pelo cotidiano das pessoas pobres”, disse Conceição, afirmando ainda que a cena literária busca esse direito à democracia, e acrescenta: “Não dou voz às mulheres negras. A minha voz é a voz das mulheres negras”.

Ainda durante o evento, o escritor Geovani Martins, vencedor do prêmio Rio Literatura, contribuiu com o debate criticando a forma de viver imposta pelo capitalismo e o direito à democracia. “Hoje em dia, o meu trabalho profissional é pensar como a gente constrói esses caminhos [para a democracia], porque para mim é muito desesperador ver, por exemplo, o capitalismo vender o fim do mundo. E aí, a gente está vendo propagandas vendendo casas que são adaptadas para o calor que a gente vai enfrentar, sendo que a gente não se prepara para como refrear esse calor. A gente fica aqui com medidas paliativas autoritárias.  Porque a gente tem uma população de milionários e de pessoas super ricas que estão falando pra gente”, conta Geovani. “Então, a minha literatura hoje é uma literatura que está se caminhando por um lugar utópico, porque eu queria que a gente conseguisse voltar a sonhar num mundo diferente, voltar a falar sobre um mundo diferente, até o momento que a gente comece a voltar a acreditar que é possível construir uma literatura.”

Os autores ainda falaram sobre a censura sofrida pela obra Avesso da Pele, de Jeferson Tenório, que teve recolhimento dos exemplares distribuídos a alunos do ensino médio, no Rio Grande do Sul. Para Cida Pedrosa, foi um episódio de “muita tristeza”, pois “quem tem que decidir se consome uma literatura é o povo, nenhuma estrutura de poder”. Para Geovani, “ainda lidamos com a arte de uma forma muito hierarquizada”, e é preciso “criar espaços que sejam confortáveis para quem produz e quem consome a arte”. Já Conceição Evaristo questiona: “a censura é sobre a autoria ou a obra? O que incomoda? Será que se fosse escrito por algum homem branco já consagrado, que se fosse dessa região de lugares já legitimados, existira essa grande censura?”.

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