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Acordo entre Brasil e EUA é avanço histórico para o movimento sindical

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Acordo entre Brasil e EUA é avanço histórico para o movimento sindical

 

Lula e Biden são de campos ideológicos diferentes, mas o interesse comum numa agenda pró-sindicatos os une em boa hora

 

Foto: Ricardo Stuckert/PR

Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e dos Estados Unidos, Joe Biden, fizeram história nesta quarta-feira (20), em Nova York (EUA), ao assinarem a Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras. Eixos como o trabalho decente, o combate à precarização e a sustentabilidade estão devidamente contemplados no acordo. Mas a valorização das negociações coletivas e dos sindicatos é seu feito maior.

Desde a grande crise capitalista de 2007/2008, a maioria dos países promoveu mudanças na legislação que, por regra, cortaram direitos e enfraqueceram o movimento sindical. Em estudo para a OIT (Organização Internacional do Trabalho), os pesquisadores Dragos Adascalieti e Clemente Pignatti Morano contabilizaram reformas trabalhistas em nada menos que 110 países entre 2008 a 2014.

No Brasil, a reforma de 2017, sob o governo Michel Temer (MDB), retirou atribuições dos sindicatos, fragilizou as negociações coletivas e atacou a sustentação administrativo-financeira das entidades, com o fim do imposto sindical compulsório. A Justiça do Trabalho também foi alvo da ofensiva liberal. A chegada da extrema-direita ao poder, com Jair Bolsonaro, inviabilizou a reconstrução desses pilares do sindicalismo.

Para piorar, o discurso populista de Bolsonaro, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos com Donald Trump, seduziu diversos segmentos da classe trabalhadora – dos uberizados aos profissionais liberais. O índice de trabalhadores sindicalizados caiu de 16,1% em 2012 para 9,2% em 2022, conforme indicou, na semana passada, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, do IBGE.

Nos Estados Unidos, a taxa de associação a sindicatos é parecida – em 2022, estava em 10%, segundo a Secretaria de Estatísticas Trabalhistas. Mas, se o rendimento médio dos trabalhadores é maior lá, em contrapartida as convenções e os acordos coletivos só valem, hoje, para um a cada dez trabalhadores.

“O trabalhador (norte-americano) precisa negociar diretamente com o patrão suas férias e dias de licença médica, que com frequência são a mesma coisa e não superam os 15 dias anuais. Licença-maternidade também não é assegurada nacionalmente e depende da política do empregador e de alguma cobertura do governo local para existir”, registrou Mariana Sanches na BBC News. “Não há qualquer tipo de FGTS. O funcionário dispensado nada tem a receber pela rescisão do contrato, que não precisa ser justificada.”

Tampouco há unicidade sindical nos Estados Unidos. Uma mesma empresa ou categoria pode ter várias entidades representativas, e esse modelo tem se revelado uma benção para os patrões. A verdade é que o sindicalismo norte-americano não se recuperou até hoje da nefasta Lei Taft-Hartley, de 1947, que praticamente criminalizou o sindicalismo classista e dificultou a realização de greves.

Lula e Biden são de campos ideológicos diferentes, mas o interesse comum numa agenda pró-sindicatos os une em boa hora. No Brasil, grupos de trabalho debatem temas como a revisão da lei trabalhista e a regulamentação do trabalho por plataformas. O STF (Supremo Tribunal Federal) acaba de validar uma modalidade de financiamento aos sindicatos, a contribuição assistencial, e um dos GTs avança na formulação de outra fonte, a contribuição (ou taxa) negocial.

Nos Estados Unidos, o movimento sindical promove a maior onda de greves dos últimos 40 anos. Uma das mais recentes é a paralisação conjunta – e sem precedentes – de 13.200 operários da GM (no Missouri), Ford (em Michigan) e Stellantis (em Ohio). Iniciada em 15 de setembro e convocada pelo UAW (United Auto Workers, o Sindicato dos Trabalhadores Automotivos), a greve reivindica novos acordos coletivos (os últimos venceram no dia 14) e garantias contra demissões.

Outra causa em jogo é a sindicalização de metalúrgicos envolvidos na fabricação de veículos elétricos. Leis recentes deixaram parte desses trabalhadores mais desprotegidos, e o governo Biden pode ajudar especialmente nessa questão – a Casa Branca nomeou dois gestores para participar das negociações. De resto, o movimento sindical antevê riscos. A produção de carros elétricos requer apenas 60% da mão de obra usada na produção de veículos automotores.

“Esta é, de certa forma, uma batalha de vida e morte para o sindicato”, resumiu o analista Rana Foroohar no Financial Times. Mas também pode ser “vida e morte” para Biden, que buscará a reeleição em 2024. “A adesão aos sindicatos caiu muito nos EUA nas últimas décadas, mas ainda representa uma parte importante da coligação eleitoral democrata. Uma das razões pelas quais Donald Trump foi eleito em 2016 foi porque os sindicatos em estados indecisos, como a Pensilvânia, votaram nele.”

Ao assinar a Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras, Lula reforçou que os dois lados têm a ganhar, desde que o movimento sindical saia efetivamente fortalecido. “Não há democracia sem sindicato forte. Porque o sindicato é efetivamente quem fala pelo trabalhador para tentar defender os seus direitos”, disse Lula.

A cerimônia contou com a participação de Gilbert F. Houngbo, diretor da OIT (Organização Internacional do Trabalho), e de presidentes de centrais sindicais brasileiras, como Adilson Araújo, da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil). “A depreciação do trabalho imposta pela agenda neoliberal produziu crises e ressuscitou o nazifascismo”, lembrou Adilson. “O mundo tem de mudar de rumo.”

Leia abaixo a Declaração Conjunta Brasil-EUA sobre a Parceria pelo Direito dos Trabalhadores e Trabalhadoras

Nossos governos afirmam o compromisso mútuo com os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras e a promoção do trabalho digno.

Os trabalhadores e trabalhadoras construíram os nossos países – desde as nossas infraestruturas mais básicas e serviços críticos, à educação dos nossos jovens, ao cuidado dos nossos idosos, até nossas tecnologias mais avançadas. Os trabalhadores e trabalhadoras e os seus sindicatos lutaram pela proteção no local de trabalho, pela justiça na economia e pela democracia nas nossas sociedades – eles estão no centro das economias dinâmicas e do mundo saudável e sustentável que procuramos construir para os nossos filhos. Face aos complexos desafios globais, desde as alterações climáticas ao aumento dos níveis de pobreza e à desigualdade econômica, devemos colocar os trabalhadores e trabalhadoras no centro das nossas soluções políticas. Devemos apoiar os trabalhadores e trabalhadoras e capacitá-los para impulsionar a inovação que necessitamos urgentemente para garantir o nosso futuro.

Hoje, os Estados Unidos e o Brasil anunciam o lançamento da nossa iniciativa global conjunta para elevar o papel central e crítico que os trabalhadores e trabalhadoras desempenham num mundo sustentável, democrático, equitativo e pacífico. Já compartilhamos a compreensão e o compromisso de abordar questões críticas de desigualdade econômica, salvaguardar os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, abordar a discriminação em todas as suas formas e garantir uma transição justa para energias limpas. A promoção do trabalho digno é fundamental para a consecução da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Também estamos preocupados e atentos aos efeitos no trabalho da digitalização das economias e do uso profissional da inteligência artificial no mundo do trabalho.

Com esta nova iniciativa, pretendemos expandir a nossa ambição e reforçar nossa parceria para enfrentar cinco dos desafios mais urgentes enfrentados pelos trabalhadores e trabalhadoras em todo o mundo: (1) proteger os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, tal como descritos nas convenções fundamentais da OIT, capacitando os trabalhadores e trabalhadoras, acabando com exploração no trabalho, incluindo o trabalho forçado e trabalho infantil; (2) promoção do trabalho seguro, saudável e decente, e responsabilização no investimento público e privado; (3) promover abordagens centradas nos trabalhadores e trabalhadoras para as transições digitais e de energia limpa; (4) aproveitar a tecnologia para o benefício de todos; e (5) combater a discriminação no local de trabalho, especialmente para mulheres, pessoas LGBTQI e grupos raciais e étnicos marginalizados. Pretendemos trabalhar em colaboração entre os nossos governos e com os nossos parceiros sindicais para fazer avançar estas questões urgentes durante o próximo ano, vislumbrando uma agenda comum para discutir com outros países no G20 e na COP 28, COP 30 e além.

Saudamos o apoio e a participação dos líderes sindicais dos nossos países e das organizações globais, bem como da liderança da Organização Internacional do Trabalho, e esperamos que outros parceiros e aliados se juntem a este esforço. Juntos, podemos criar uma economia sustentável baseada na prosperidade compartilhada e no respeito pela dignidade e pelos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras.

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