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Saídas simplistas não resolvem complexidade da violência nas escolas

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Saídas simplistas não resolvem complexidade da violência nas escolas

 

Aumento no número de ataques em instituições de ensino demanda políticas públicas e mudanças culturais que enfrentem o discurso de ódio e a banalização da violência

 

Professores protestam contra a violência nas escolas em frente à Secretaria de Educação de SP. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Os mais recentes ataques a instituições de ensino no Brasil colocaram em evidência um grave e complexo problema nacional que, não à toa, vem crescendo nos últimos anos na mesma medida em que o país vivencia a ascensão do discurso de ódio e a apologia da violência pelo bolsonarismo. A questão envolve desde o estímulo ao extremismo via redes sociais até aspectos psicológicos e sociais enfrentados pela população, sobretudo crianças e adolescentes. Lidar com essa situação é urgente e vem desafiando governos, entidades e especialistas de diversas áreas.

Pesquisa divulgada no final de março pelo Instituto Locomotiva em parceria com o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) aponta que 68% dos professores, 69% dos estudantes e 75% dos familiares de alunos consideram haver um nível médio ou alto de violência nas escolas estaduais paulistas.

O levantamento também aferiu o sentimento relativo ao nível de violência em suas próprias escolas: 55% dos estudantes, 61% dos professores e 70% dos familiares o consideram médio ou alto. Além disso, 48% dos estudantes e 19% dos professores afirmam ter sofrido algum tipo de violência em suas escolas. A pesquisa foi feita entre os dias 30 de janeiro e 21 de fevereiro e ouviu 1,25 mil estudantes, 1,25 mil famílias e 1,1 mil professores.

No final de março, o medo revelado no estudo se materializou mais uma vez. A professora Elisabete Tenreiro, de 71 anos, foi morta a facadas por um aluno na Escola Estadual Thomazia Montoro, na capital paulista; outras três professoras ficaram feridas. Pouco depois, no dia 5 de abril, a creche Bom Pastor, em Blumenau (SC), teve quatro de seus alunos assassinados por um homem que invadiu o local e os atacou a machadinha. Outras quatro crianças ficaram feridas.

Levantamento feito pela pesquisadora Michele Prado, do Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP (Universidade de São Paulo), registrou 22 ataques a escolas entre outubro 2002 e março de 2023 no país. De acordo com a BBC Brasil, o número de ataques em escolas no Brasil nesse período já supera o total registrado nos 20 anos anteriores, segundo pesquisadores.

Nesta semana, novos casos reforçaram esse cenário de barbárie: na segunda-feira (10), adolescente armado feriu superficialmente uma professora e dois alunos com uma faca, em uma escola particular em Manaus; na terça (11), em Santa Tereza de Goiás (GO), um estudante feriu outros três a faca. Neste mesmo dia, um adolescente de 14 anos foi apreendido por suspeita de planejar um ataque a uma escola em Maquiné (RS) — a polícia encontrou material de conteúdo neonazista em sua casa e os pais do jovem  também foram presos em flagrante por apologia do nazismo e associação criminosa.

Leia também: Estímulo às armas cria cenário propício a ataques em escolas

Desafio urgente

A bomba a ser desarmada no que diz respeito à violência nas escolas envolve diferentes aspectos. A promoção do discurso de ódio, a facilitação do acesso a armas e a banalização da violência provenientes da atuação do próprio ex-presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores; o ambiente de verdadeiro vale-tudo nas redes sociais igualmente protagonizado por esse segmento político; as defasagens no campo educacional enfrentadas por toda rede de ensino, tanto pública quanto privada, e a falta de assistência psicológica e social para a comunidade escolar estão entre os fatores que criaram o caldo ideal para esse cenário de horror.

“De cinco anos para cá, passamos por uma banalização da violência. O uso de armas de fogo, de um discurso de ódio, separatista, racista, misógino, homofóbico, até por autoridades oficiais, com isso ganhando escala pública, tudo isso faz com que as pessoas que cultivavam esses valores no seu ambiente privado passem a ganhar corpo público”, disse à BBC Brasil a pesquisadora da Unicamp, Danila Di Pietro.

Segundo especialistas, respostas simplistas como policiar as escolas ou instalar detector de metais não darão conta de tamanha complexidade. “Não basta acreditar que colocar um policial armado na escola vai resolver o problema. Já tivemos casos em escolas cívico-militares, por exemplo. Em Aracruz, a escola estava trancada com cadeado. Não se trata só de uma segurança, de trancafiar as nossas crianças. A gente tem que fazer políticas públicas de promoção da convivência democrática e criar uma sociedade onde as pessoas possam conviver, dialogar, onde a violência não seja tolerada, não seja exaltada”, ressalta Danila Zambianco, doutoranda em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em entrevista à Agência Brasil.

Na avaliação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE),“a cultura de paz e a elaboração de protocolos de enfrentamento à violência escolar devem suscitar esforços nacionais, regionais e locais para que, pensados e construídos também pela própria comunidade escolar, e com o apoio de estudiosos de todos os campos de conhecimento, possamos contribuir com o fim desse cenário de violência”.

À Agência Brasil, Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, explica que “para combater a violência extremista nas escolas, é necessário fortalecer os grêmios estudantis, as associações de pais, responsáveis e os conselhos escolares como meios de mobilização. Além disso, é importante aprimorar as disciplinas de humanidades, incluindo abordagens antirracistas, feministas e emancipadoras”.

Ela aponta ainda que é fundamental oferecer formação continuada aos profissionais da educação e capacitá-los a identificar sinais de aproximação de grupos extremistas e a combater múltiplas formas de violência.

Redes sociais

Outra frente de atuação urgente é a das redes sociais. Artigo escrito pela diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, e pela psicóloga e coordenadora de projetos do instituto, Danielle Tsuchida, publicado pela CNN, destaca que “essa subcultura (de ódio), aliada à mudança na sociabilização de crianças e jovens, muito mais mediada pelo mundo digital, coloca um novo desafio para família, escola e estado: como supervisionar e apoiar esse uso da internet de forma a torná-lo mais saudável e minimizar o risco de envolvimento nessa cultura violenta”.

Elas defendem que o tema seja tratado também via políticas públicas, “assim como devem ser reguladas essas plataformas digitais onde crianças e jovens se encontram, conversam, idolatram discursos extremistas e planejam possíveis ataques”. E completam: “É ainda essencial, na prática cotidiana, uma escola que atue a partir da comunicação não violenta, com relações construídas na base da cooperação e empatia, com respeito às diferenças. A capacidade da escola lidar com questões de saúde mental é urgente também”.

Em resposta a esses desafios, medidas vêm sendo tomadas no âmbito do governo Lula. Um grupo de trabalho interministerial, coordenado pelo Ministério da Educação, foi criado no dia 6 e tem 90 dias para apresentar um relatório final sobre o tema e uma proposta de ações para a construção de uma política nacional de enfrentamento à violência.

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Outras medidas imediatas também foram tomadas. Segundo informado pelo UOL, o Ministério da Justiça e Segurança Pública está coordenando um monitoramento sobre ameaças contra escolas com a participação dos 27 estados. Além disso, a pasta lançou um site para receber denúncias anônimas e publicou edital para o repasse de R$ 150 milhões para estados e municípios tomarem medidas de enfrentamento à violência nas escolas.

O MJSP também já identificou e pediu a exclusão, nos últimos dias, de mais de 500 perfis no Twitter em que há apologia à violência ou ameaças. E, após reunião com representantes das plataformas, foi anunciado que em breve será lançada portaria obrigando as redes sociais a prevenirem a publicação e removerem conteúdos relativos a ataques a instituições de ensino.

“Nós não estamos dizendo que as plataformas de tecnologia são as únicas responsáveis pelo discurso de ódio nas escolas. Não. Nós sabemos que há múltiplas determinações. Porém, não há dúvida de que pelo modo como a sociedade contemporânea se estrutura, um elo fundamental da cadeia de violência nas escolas está exatamente na propagação desses discursos por intermédio dessas postagens”, disse o ministro Flávio Dino durante coletiva de imprensa nesta terça-feira (11).

Ele defendeu ainda que haja “adequação entre o peso dessas empresas de tecnologia na rede de violência e a responsabilidade jurídica que elas têm e as medidas que nós esperamos que elas venham a adotar”.