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A diplomacia imperialista dos Estados Unidos

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A diplomacia imperialista dos Estados Unidos

 

A supremacia militar parece ser o último refúgio da hegemonia imperial dos EUA e o crescimento das tensões e conflitos internacionais ressuscitou velhos e perturbadores fantasmas da guerra fria.

 

Ilustração: Brum

O encontro entre os presidentes Lula (Brasil) e Joe Biden (EUA) no dia 10 de fevereiro, em Washington, ficou marcado pela decepção do governo brasileiro com a miserável contribuição acenada pelos EUA para o Fundo Amazônia, equivalente a US$ 50 milhões.

Em contraste, dez dias depois, durante uma “viagem surpresa” à Ucrânia, Biden anunciou um novo pacote de US$ 500 milhões para financiar o conflito militar contra a Rússia. No total, os gastos militares do governo estadunidense para prolongar a guerra e impor uma derrota a Moscou ultrapassaram US$ 100 bilhões em 2022.

A retórica norte-americana com o meio ambiente soa falsa diante dessa discrepância de valores.

Hegemonia global

Os reais interesses que movem a diplomacia imperialista EUA não são inspirados por nobres intenções, ao contrário do que sugere a retórica recorrente da Casa Branca sobre defesa da democracia, dos direitos humanos e do direito à soberania e autodeterminação dos povos e nações. São de outra natureza.

Recompor e ampliar uma hegemonia global em processo de declínio é o sonho que incita o comportamento dos líderes do imperialismo em Washington. Eles estão determinados a atropelar tudo que interpretem como obstáculo neste caminho ou ameaça a este objetivo. É o caso da Rússia, acossada pela expansão da Otan e as “revoluções coloridas”.

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Após o fim da URSS, tirando partido do caos econômico e da embriaguez política que acompanhou a restauração do capitalismo na Rússia, a Otan instalou seus tentáculos em vários países do antigo Pacto de Varsóvia, dissolvido em 1991. Quando a Rússia acordou, percebeu que estava sob o cerco militar do chamado Ocidente.

Zelensky atende interesses dos Estados Unidos e da Otan l Foto: Casa Branca

Com o provável ingresso da Ucrânia, arrancada da órbita russa por um golpe de Estado liderado pela extrema direita em 2014, a poderosa organização militar liderada pelos EUA – que deveria ter o mesmo destino do Pacto de Varsóvia se Washington desejasse paz após o fim da guerra fria – chegaria às portas de Moscou. É o que Vladmir Putin tenta evitar.

O conflito em curso no leste da Europa não é uma peleja entre Putin e Zelensky, mas uma guerra entre a Rússia e os EUA, que comandam a Otan e manipulam os líderes europeus, uma guerra por procuração, conforme notou o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov.

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Na contramão da história

A ofensiva dos EUA para manter a hegemonia global vai de encontro ao processo histórico de decadência de sua liderança econômica no mundo, que tem por contrapartida a ascensão da China.

Esta é uma realidade provocada por leis objetivas da história, com destaque para a assimetria das taxas de crescimento dos PIBs, o chamado desenvolvimento desigual, associado ao parasitismo econômico configurado no déficit externo e na desindustrialização da economia norte-americana. É um fenômeno que ocorre à margem das vontades dos governos e já não pode ser revertido por artifícios políticos.

Os desdobramentos geopolíticos do progressivo deslocamento do poder econômico dos EUA para a China, e de forma mais ampla do Ocidente para o Oriente, são inevitáveis. A relativa ineficácia das duras sanções econômicas impostas à Rússia pelos EUA e potências aliadas, anunciadas como uma bomba nuclear contra a economia russa, é um sinal disto, ou seja, um sintoma de fraqueza e decadência do Ocidente e de emergência de uma outra correlação de forças na economia global, o que fortalece a necessidade histórica de uma nova ordem mundial.

Isto explica a obsessão das elites norte-americanas em conter a ascensão da China, propósito que provavelmente não poderá ser alcançado por meios convencionais.

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Joe Biden está dobrando a aposta no protecionismo e, numa ironia da história, virando pelo avesso os dogmas neoliberais traduzidos no Consenso de Washington. Mas as causas mais profundas do declínio norte-americano, radicadas no déficit externo, especialmente o comercial (que em 2022 bateu novo recorde, aproximando-se de US$ 1 trilhão), continuam atuando, e a guerra econômica contra a China, deflagrada por Donald Trump, não deu os resultados pretendidos.

Sede de guerra

Irmanado com o fator geopolítico atuam os interesses econômicos da oligarquia que domina e explora o chamado complexo industrial militar. Um ramo da indústria que tem uma relevância extraordinária para a economia norte-americana e uma influência invejável na definição dos rumos da política externa e do orçamento público.

Uma lógica macabra define os interesses desta oligarquia burguesia que, nos subterrâneos da política, orienta a mão forte do imperialismo. O capital industrial, como ensinou o pensador alemão Karl Marx, realiza-se no comércio, com a venda de mercadorias ou a metamorfose do capital-mercadoria em capital-dinheiro.

Se a venda não se efetiva, frustra-se o processo de valorização do capital e se isto ocorre em larga escala as mercadorias se acumulam e advém a crise de superprodução que recorrentemente perturba a economia burguesa.

A acumulação e expansão do capital investido no complexo industrial-militar dos EUA pressupõem uma demanda contínua e crescente pela mercadoria que os oligopólios da defesa produzem, ou seja, por armas. É um ramo da indústria que, por natureza, se alimenta da morte e tem sede de guerra.

Se a demanda é insuficiente para absorver a produção, o problema não é deixado ao arbítrio da mão invisível do mercado, que provavelmente determinaria uma redução da produção e de preços. O governo dos EUA tem bons meios de ampliar artificialmente a demanda semeando intrigas, tensões diplomáticas e conflitos militares. Também garante uma demanda cativa expressa no orçamento militar, o maior e o que mais cresce ano a ano no mundo.

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Não é sem razão que autoridades russas acusam a Casa Branca de estar manobrando para protelar o confronto na Ucrânia, fornecendo armas poderosas ao governo fantoche instalado em Kiev e tirando proveito financeiro disto.

Os EUA são os maiores exportadores de armas do mundo e as classes dominantes do país estão extraindo lucros fabulosos do conflito. Ao mesmo tempo que joga lenha na fogueira da guerra, a Casa Branca lança acusações sobre outros países, comportamento que uma porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China caracterizou como “algo imoral e irresponsável”.

Investimento incrivelmente lucrativo

O número e o valor das vendas de armas aprovadas pelos Estados Unidos a seus aliados da Otan quase dobraram em 2022 em comparação com 2021. Países asiáticos aliados dos EUA, como o Japão, também estão ampliando a demanda por produtos bélicos.

Em 2021, o governo Biden aprovou 14 grandes vendas de armas para aliados da Otan no valor de cerca de US$ 15,5 bilhões. Em 2022, o volume saltou para 24 possíveis grandes vendas de armas no valor de cerca de US$ 28 bilhões, incluindo US$ 1,24 bilhão em vendas para a Finlândia, futura membro da organização bélica

A Bolsa de Nova York registrou uma valorização de até 71% das multinacionais associadas ao ramo nos primeiros 40 dias de guerra. O valor das gigantes Lockheed Martin, Raytheon Techologies e Honeywell International, somado, saltou de US$ 366 bilhões para acima de US$ 408 bilhões (alta de 11%) desde o início da guerra. Lockheed e Raytheon são as duas maiores do setor de defesa. Empresas do ramo relativamente menores cresceram ainda mais.

Em análise para o Center for European Policy Analysis (CEPA), Timothy Ash, membro do think tank britânico Chatham House, observou: “As guerras são vitrines para os fabricantes de defesa. O erro de julgamento de Putin apenas proporcionou uma fantástica oportunidade de marketing para seus concorrentes ocidentais”.

Observando os imensos ganhos auferidos pelos empreiteiros de defesa dos EUA e da Grã-Bretanha, Ash acrescenta que o apoio dos EUA e do chamado Ocidente à Ucrânia é um “investimento incrivelmente lucrativo”.

Influência até “espiritual”

Muitos economistas enxergam na prosperidade deste ramo singular da indústria privada, dominado por oligopólios que se alimentam da destruição e da morte, a principal causa do crescimento do PIB nos EUA ao longo dos últimos anos.

A influência econômica, política e cultural desses verdadeiros senhores da guerra é proporcional ao capital que acumulam. Eles têm primazia na definição do orçamento público e, igualmente, na diplomacia, ou seja, na política externa imperialista, ornamentada com uma retórica enganosa .

O ex-presidente Eisenhower, em 1961, num tom autocrítico, já alertava para a crescente influência do complexo industrial militar no país.

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“Essa conjunção de um imenso establishment militar e uma grande indústria de armas é nova na experiência estadunidense. A influência total – econômica, política e, até mesmo, espiritual – é sentida em cada cidade, em cada legislativo”, constatou do seu privilegiado posto de observação.

Assim como a dívida pública é essencial para a realização e expansão do capital de banqueiros e rentistas, condicionando no Brasil as políticas fiscal e monetária, o orçamento militar e a política externa a serviço da expansão do complexo industrial-militar são, hoje, uma peça fundamental na engrenagem de reprodução do capitalismo estadunidense, cada vez mais dependente daquilo que os economistas caracterizam de “keynesianismo de guerra”.

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Isto explica o interesse dos EUA em fomentar conflitos e prolongar a guerra no leste europeu. Lênin, o arquiteto da revolução soviética, tinha razão quando afirmou que sob o imperialismo a guerra é simplesmente inevitável.

Com crescentes provocações à China, a Casa Branca provavelmente está procurando cavar uma nova guerra por procuração na Ásia, desta vez tendo por arena a ilha de Taiwan, uma província chinesa ocupada por forças políticas derrotadas pelo Partido Comunista na revolução de 1949, que se aliaram aos EUA e buscaram refúgio na ilha.

Fantasmas da guerra fria

A ofensiva imperialista ressuscitou o espírito e os fantasmas da Guerra Fria e está promovendo uma temerária corrida armamentista entre as nações. Ao longo das duas últimas décadas, os gastos militares globais saltaram de US$ 1 trilhão para US$ 2 trilhões, segundo a Stockholm International Peace Research Institute (Sipri). Em 2021, bateram novo recorde e atingiram US$ 2,1 trilhões (cerca de R$ 10,2 trilhões).

Os EUA, com cerca de 750 bases militares instaladas em 88 diferentes países, respondem por 38% dos gastos militares globais. Para este ano, o Senado ianque aprovou um novo recorde no orçamento militar, no valor de US$ 858 bilhões, um avanço de 10% em relação ao recorde do ano passado, justificado por aportes de ajuda militar à Ucrânia e a opositores de Pequim.

Um sistema que faz da guerra um lucrativo modo de vida não pode estar genuinamente preocupado com a destruição da natureza.

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A supremacia militar parece ser o último refúgio da hegemonia imperial dos EUA e o crescimento das tensões e conflitos internacionais ressuscitou velhos e perturbadores fantasmas da guerra fria. Entre eles, a hipótese de uma devastadora Terceira Guerra Mundial. “Não sei se haverá Terceira Guerra Mundial, mas se houver, certamente a Quarta será a pauladas”, afirmou Einstein.

À margem da retórica diplomática, os fatos indicam que a maior ameaça com que o planeta terra e a humanidade, em seu conjunto, se defrontam neste momento histórico provém do sistema imperialista. Urge superá-lo para assegurar a convivência pacífica entre as nações, enfrentar a crise ambiental e assegurar a paz mundial.

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