História em Pedaços!
Gente boa do Blog,
A Academia Catalana de Letras relata que, alguns profissionais de antigamente, em razão da ausência de recursos, se tornaram verdadeiros cientistas nas suas atividades.
Um deles foi João Martins Teixeira, laboratorista e farmacêutico formado que, sem instrumental e condições adequadas, realizou a primeira transfusão de sangue em Catalão, bem na metade do século passado.
Usou uma aparelhagem criada por ele próprio (que funcionou à gravidade) e utilizou o próprio sangue nessa primeira experimentação.
Em 1948, João Martins Teixeira havia inaugurado um pequeno laboratório de análises clínicas. Catalão ainda não tinha hospital e, no próprio estado de Goiás, somente haviam laboratórios similares em Goiânia e Anápolis.
Foto: João Martins/ acervo Luís Estevan
O desafio da transfusão veio em 1951. A pedido do médico Lamartine Pinto de Avelar, o laboratorista aceitou o desafio de preparar uma delicada intervenção sanguínea para uma paciente acamada, em uma fazenda a vinte quilômetros da cidade de Catalão.
Tratava -se de uma jovem mãe, de 17 anos, com retenção de restos placentários, perda sanguínea, infecção e anemia. Impossível o seu deslocamento ou qualquer providência que não fosse a transfusão sanguínea no local.
Nunca havia sido feito algo parecido em Catalão. O próprio João Martins registrou o caso em seu livro de memórias, expondo as dificuldades e dúvidas que enfrentou. O seu relato foi minucioso.
“Adquiri, numa farmácia, uma ampola de soro de 500ml e serrando a sua ponta fina e reta extraí dela o soro, deixando apenas 70ml. Com esse material fiz uma solução de citrato de sódio 2,5% (anticoagulante usado para hemossedimentação).
Apliquei na ponta serrada da ampola, um tubo de látex atado a uma pinça de Mohor. Consegui na farmácia um aparelho de aplicação de soro com conta gotas e também tubo de látex para, junto com uma agulha calibre 12 e o conta gotas, montar a aparelhagem de aplicação de sangue. Todo esse material foi esterilizado em autoclave, a 100 graus, vapor fluente e embalado em caixas metálicas porta seringas, usadas na época…”
Na fazenda, o médico e o laboratorista não encontraram ninguém disposto ou em condições de ser o doador de sangue. Para ajudar a paciente, João Martins não titubeou.
Sem demora, puncionou a veia do seu próprio braço iniciando a delicada transfusão. Tirando os calafrios, elevação de temperatura e efeitos colaterais desse procedimento, a operação transcorreu sem nenhum problema. No outro dia, nova transfusão. Mas, dessa feita, com sangue doado pelo Sr. Elias Farid Safatle.
Uma semana depois, a paciente (Almerinda Nicolina da Silva) foi removida para a cidade, onde se recuperou, vindo a falecer somente 58 anos depois, em 2009.
João Martins Teixeira nasceu na zona rural de Catalão em 1924, filho de Olegário Martins Teixeira e de Clotildes Maria Borges. Fez seus primeiros estudos em Catalão, formando-se posteriormente em Ribeirão Preto-SP. Dedicou sua vida inteira às atividades de análises clínicas, trabalhando em hospitais locais, atendendo a exames, transfusões de sangue e anestesias. Inúmeros catalanos passaram pelas suas mãos. No hospital Nasr Fayad (1958 a 1970) realizou 6.750 anestesias. Na Santa Casa (1966 a 2008) mais de 7.200 anestesias, além de comandar o laboratório daquela entidade. Atuou também em Goiandira (1953 a 1972) onde realizou em torno de 4.500 anestesias.
Ao todo, anotações feitas pelo próprio laboratorista, meticuloso e organizado na sua vida profissional.
De resto, João Martins Teixeira foi de tudo um pouco. Encontrou tempo para se dedicar ao magistério, tendo feito brilhante carreira de professor de biologia.
Foi músico e compositor, sendo autor do hino do colégio estadual João Netto de Campos e de uma bela valsa em homenagem ao centenário de Catalão. Dedicou seu tempo livre ao rádio amador, ao iatismo e à literatura, tendo sido membro atuante da Academia Catalana de Letras.
Por: Luís Estevam