Oposição reage a oferta de R$ 20 mi para quem aprovar reforma: “escárnio” e “fraude”
A promessa do governo Jair Bolsonaro (PSL) de liberar R$ 20 milhões em emendas parlamentares para cada deputado e deputada que votar a favor da reforma da Previdência, segundo noticiado pela agência Reuters, recebeu pesadas críticas da oposição.
“É o mesmo ‘toma lá da cá’ dos outros governos, indo na contramão do discurso eleitoral do senhor Bolsonaro, então, é o mesmo e velho método. É instrumento de ‘convencimento remunerado’. Isso é um absurdo”, critica a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), vice-líder da minoria.
A declaração da parlamentar é uma referência ao discurso de Bolsonaro – antes e depois da campanha eleitoral – de que ele praticaria uma “nova política”, em contraposição a práticas históricas de negociatas entre atores políticos.
“É um grande absurdo de um governo que está desesperado pra dar sinais ao mercado, ou seja, é uma fraude. Você ter um parlamentar que vai receber uma quantidade maior de emendas porque vai votar a favor de uma matéria que retira a aposentadoria de milhões de pessoas é um escárnio”, considera o deputado Glauber Braga (Psol-RJ).
As emendas orçamentárias são meios pelos quais os parlamentares decidem sobre a alocação de recursos públicos nos seus respectivos estados, permitindo a canalização de verba para projetos, instituições, serviços públicos etc. O dinheiro vem do Orçamento Geral da União, definido pela Lei Orçamentária Anual (LOA). Pelas normas atuais, os parlamentares têm direito obrigatoriamente a cerca de R$ 15,4 milhões em emendas.
No tatame da política, é comum que elas sejam usadas como objeto do jogo de forças entre Executivo e Legislativo, servindo para facilitar ou dificultar a adesão de parlamentares a projetos de interesse da Presidência da República. Também são utilizadas por deputados e senadores nas relações com prefeitos e vereadores nas suas bases. A liberação de emendas fora do orçamento, no entanto, não tem previsão normativa, embora também seja usada como instrumento de negociação.
Comissão e plenário
Na comissão especial, a aprovação da reforma, chamada oficialmente de Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019, é tida como certa, por conta das negociações entre governo e partidos do chamado “centrão”, espectro que reúne partidos da direita liberal, como PP, PR, Solidariedade, MDB e PSD. O grupo, que tem alinhamento neoliberal, é maioria no colegiado, contando com pelo menos 21 das 49 cadeiras da comissão.
No plenário, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem afirmado que o governo teria hoje entre 314 e 320 apoios ao texto, podendo chegar a 380 – número considerado ideal porque garantiria uma margem de segurança diante do risco de traição, um componente sempre presente no jogo político. Alguns deputados, no entanto, acreditam que a projeção pode não corresponder à realidade e põem em xeque as contas de Maia, acreditando que o governo ainda não teria atingido os 308 votos necessários.
Na avaliação de Glauber Braga, o resultado eleitoral de 2018, o primeiro após a aprovação da reforma trabalhista do governo de Michel Temer (MDB), ainda seria motivo de trauma e, por isso, estaria inspirando cautela em parlamentares que estejam indecisos diante da votação da PEC. Para o psolista, a pressão popular também contribui para a indefinição em torno da proposta, que tem sido duramente criticada por sindicatos, movimentos populares e outros atores.
“Vários deputados que votaram a favor da reforma trabalhista não retornaram à Câmara e outros que retornaram tiveram uma diminuição sensível nas suas votações. Os deputados que estão chegando agora e aqueles que já são mais experientes sabem disso. Quando o deputado imaginar que, levando uma emenda ele vai estar desculpado por votar contra o direito das pessoas, acho que as pessoas vão cobrar essa fatura”, calcula, acrescentando que espera uma mobilização popular nesta primeira quinzena de julho para tentar frear a PEC.
No calendário do governo, a ideia seria aprovar o texto antes do recesso parlamentar, que se inicia em 18 de julho. Apesar disso, a leitura geral é de que as disputas que envolvem a reforma tendem a empurrar a votação em plenário para o próximo semestre.
Governo
O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa de Maia para tratar da suposta promessa, mas ele preferiu não se manifestar. O mesmo procedimento foi adotado em relação à Casa Civil, que não deu retorno até o fechamento desta matéria.
Esta não é a primeira vez que a imprensa denuncia a chamada “compra de votos” via emendas no governo Bolsonaro. Em abril, uma reportagem da Folha de S.Paulo revelou suposto oferecimento de até R$ 40 milhões em emendas extras a cada deputado até 2022. A proposta teria sido apresentada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, durante reunião com líderes partidários na residência de Maia, principal entusiasta e articulador da pauta da Previdência dentro da instituição.
Por Brasil de Fato