Secretário de Meio Ambiente reduziu critérios de risco de barragens em Minas Gerais
O secretário de Meio Ambiente de Minas Gerais, Germano Luiz Gomes Vieira, assinou em dezembro de 2017 norma que alterou os critérios de risco de algumas barragens, o que permitiu a redução das etapas de licenciamento ambiental no Estado. A medida possibilitou à Vale acelerar o licenciamento para alterações na barragem da Mina de Córrego do Feijão, que rompeu na última sexta-feira deixando até agora 34 mortos e 256 desaparecidos.
Nomeado pelo então governador Fernando Pimentel (PT), Vieira assinou a Deliberação Normativa 217 duas semanas após assumir o posto de secretário. Ele, porém, trabalhou na elaboração da medida desde maio de 2016, quando era secretário-adjunto de Meio Ambiente. A norma permite, em alguns casos, rebaixar o potencial de risco das barragens, o que pode levar à redução do processo de licenciamento para apenas uma etapa. Antes da medida, os casos de significativo impacto ambiental do Estado passavam sempre por três fases de aprovação: Licença Prévia, Licença de Operação e Licença de Instalação. Com os novos critérios de risco, mais flexíveis, as três licenças são concedidas simultaneamente.
O governo de Minas informou, à época, que a mudança ocorreu “com vistas a melhor se adequar à atual realidade de classificação dos mais diversos empreendimentos”, com a implantação da versão simplificada de licenciamento ambiental. Em nota publicada em 11 de dezembro de 2017, a Agência Minas Gerais informou ainda que a revisão envolveu mais de 100 técnicos do sistema, ONGs e instituições ligadas à questão ambiental e que a mudança é positiva porque os critérios passariam a considerar aspectos locais e uso de novas ferramentas tecnológicas.
Apesar de ter sido nomeado pelo ex-governador petista, Vieira foi o único secretário a se manter no cargo desde a posse de Romeu Zema (Novo). A manutenção no cargo foi celebrada por representantes da indústria pelo fato de Vieira ter dado mais agilidade ao processo de licenciamento ambiental.
O rebaixamento do risco da barragem Córrego do Feijão veio à tona em 11 de dezembro do ano passado, quando a Vale levou à Câmara de Atividades Minerárias solicitação para novas operações na mina. O pedido incluía operações na barragem que rompeu, desativada desde 2015. O pedido da Vale foi aprovado por oito dos nove conselheiros, que seguiram parecer da secretaria de Meio Ambiente — comandada por Vieira. A secretaria rebaixou a classe de risco da mina de 6 (mais alto risco) para 4 (menor risco).
Com o potencial destruidor rebaixado, a Vale escapou do licenciamento padrão, conhecido como trifásico, e conseguiu aprovar de uma única vez três licenças (prévia, operação e instalação). A medida agilizou as intenções da empresa, entre elas, a de reaproveitar os rejeitos da barragem que rompeu.
O único voto contrário foi de Maria Teresa Corujo, representante do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc). “Eles queriam transformar o rejeito em produto. Para isso, voltam a beneficiar os rejeitos e misturam com minério recém extraído”, explica Corujo.
Barragem Córrego do Feijão rompeu liberando 13 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro. Foto: Corpo de Bombeiros / Divulgação
Entre fevereiro de 2017 e janeiro deste ano, apenas um projeto minerário — nas 40 reuniões realizadas — foi barrado na câmara técnica do Conselho Estadual de Política (Copam), órgão que engloba a Câmara de Atividades Minerárias. “O secretário [Germano Vieira] sempre atendeu os interesses da indústria, das empresas mineradoras e do agronegócio, por isso ele continuou no comando”, entende Corujo.
Na gestão de Vieira os licenciamentos ambientais passaram a ser feitos a “toque de caixa”, de acordo com o diretor de meio ambiente e saúde da União de Associações Comunitárias de Congonhas, Sandoval de Souza Pinto Filho.
“Os licenciamentos têm celeridade estranha, quase todos os processos têm parecer favorável às empresas e a análise técnica é inócua”, avalia Sandoval. Congonhas está a 90 quilômetros da barragem de Brumadinho, mas a cidade — tombada como patrimônio histórico da humanidade — é cercada por diversas barragens de rejeitos de mineração.
Se os ambientalistas criticam a manutenção de Vieira no comando do Meio Ambiente em Minas Gerais, representantes da indústria comemoram. “Ficamos muito esperançosos também com a manutenção no cargo de Germano Vieira. Outro profissional muito competente”, afirmou em entrevista o vice-presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), José Fernando Coura, que comanda o sindicato patronal da empresas mineradoras de Minas Gerais.
Maria Dalce Ricas, superintendente da Associação Mineira de Defesa do Ambiente, enxerga outras qualidades em Vieira, além da “boa imagem que ele conquistou com o setor privado acelerando os licenciamentos”. Para Ricas, Vieira teve o apoio dos funcionários da secretaria de Meio Ambiente por ter um perfil técnico e deu mais atenção aos parques estaduais.
Vieira entrou na secretaria em 2013 após ser aprovado por concurso público. Fez especialização em educação ambiental, mestrado em direito público e em poucos anos chegou ao comando da pasta.
Um servidor da secretaria, que pediu para não ser identificado, destaca o papel de Vieira em reduzir a burocracia nos licenciamentos e diminuir o volume de pedidos de licenciamentos ambientais. Já um promotor especializado na área ambiental, que também não quer se identificado, classifica Vieira como: “despachante da Fiemg”, em referência ao fato de o secretário atender a pedidos dos membros da indústria..
Questionado sobre as críticas pela Repórter Brasil, a assessoria de imprensa da Secretaria respondeu que “na condição de servidor público o secretário atende o que está previsto na legislação e o interesse público”. A nota, enviada por email, destaca ainda que Vieira tem perfil técnico e que foi selecionado por um processo seletivo instituído pelo governador Romeu Zema.
O governador de Minas disse, durante a campanha eleitoral, que um de seus objetivos seria reduzir a burocracia para conceder licenças ambientais. “Precisamos preservar o meio ambiente, mas temos que parar de tratar como bandido ambiental qualquer pessoa que queira empreender em Minas Gerais”, afirmou.
O Movimento pelas Serras e Águas de Minas denunciou, em setembro do ano passado, um possível conflito de interesse do secretário. O irmão dele, Giovanni Abel Gomes Vieira, é funcionário da mineradora Anglo American. A denúncia foi enviada ao Ministério Público logo depois de o secretário ter sido acusado por entidades do terceiro setor de ter acelerado o processo de licenciamento de um pedido da Anglo American. O Ministério Público, porém, não entendeu que havia conflito de interesse. A assessoria da secretaria respondeu que o secretário vai “adotar medidas judiciais cabíveis para ação de regresso por danos morais”.
Brasil de Fato