Entenda a investigação que envolve Bolsonaro às vésperas da posse
Movimentações atípicas em contas bancárias comprometem o presidente eleito, o filho Flávio e a esposa Michelle.
Por Leonardo Fernandes*
Eleito com a promessa de combater a corrupção, Jair Bolsonaro é citado em escândalo antes mesmo de assumir
Segundo o Coaf, Fabrício José Carlos de Queiróz, policial militar e ex-assessor de Flávio Bolsonaro, movimentou R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017 em sua conta bancária. Há poucas informações sobre o destino dos recursos, mas segundo o relatório, uma das transações é um cheque de R$ 24 mil destinado a Michelle Bolsonaro, esposa do presidente eleito.
No relatório, o Coaf explica que as movimentações são suspeitas por três tipos de processos identificados: 1) “Pagamentos habituais a fornecedores ou beneficiários que não apresentam ligação com a atividade ou ramo de negócio da pessoa jurídica”; 2) “Movimentações em espécie” feitas por clientes que costumam utilizar “outros instrumentos de transferência”, como “cheques, cartões de débito ou crédito”; e 3) “movimentação de recursos incompatível com o patrimônio, a atividade econômica ou a ocupação profissional e a capacidade financeira do cliente”. O Ministério Público confirmou a validade do relatório.
O documento ainda revela que a maior parte dos depósitos em dinheiro, feitos na conta do ex-motorista de Flávio Bolsonaro, coincidem com as datas de pagamento na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
Na folha de pagamento da Alerj de setembro, o motorista aparece com salário de R$ 8.517. Ele ocupava o cargo comissionado de Assessor Parlamentar III, no gabinete de Flávio Bolsonaro. Segundo o Coaf, ele também acumulava um salário de R$ 12,6 mil da Polícia Militar.
O relatório foi produzido a pedido do Ministério Público Federal e faz parte da Operação Furna da Onça, um desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro deflagrado em novembro. O deputado federal do Partido dos Trabalhadores (PT) do Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta, questiona o fato de Fabrício Queiroz e sua filha, Nathália Melo Queiroz, lotada no gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara Federal, terem sido exonerados em meio à operação.
“No mesmo dia, pai e filha pedem demissão dos seus empregos. No outro dia, é desencadeada uma operação solicitada pelo Ministério Público Federal. Então é evidente, os indícios são muito fortes de que eles receberam uma informação privilegiada, de que houve um vazamento”, analisa.
O que é o Coaf?
Criado em 1998, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e vinculado ao Ministério da Fazenda, o Coaf tem por objetivo disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar transações financeiras com suspeita de ilicitude. O Coaf é um órgão administrativo, composto por 12 conselheiros, representantes de diferentes instituições públicas, como o Banco Central, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Receita Federal, entre outros.
O órgão considera uma movimentação atípica, depósitos ou saques bancários em valores fracionados, inferiores a R$ 30 mil, ou ainda, depósitos em dinheiro ou compra de seguro ou previdência privada com recursos de origem duvidosa. Instituições financeiras como bancos, lotéricas, casas de câmbio e crediários estão obrigadas por lei a informar ao órgão esse tipo de movimentações.
Justiça para quem?
O futuro ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Sérgio Moro, isentou o presidente eleito de responsabilidade sobre o caso, ao afirmar que ele já havia esclarecido “a parte que lhe cabe no episódio”. Numa rede social, a presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores, a senadora paranaense Gleisi Hoffmann criticou o ex-juiz, responsável pela condenação sem provas do ex-presidente Lula.
“É muita cara de pau! Nem pede por investigação, averiguação, apuração, seja lá o que for. Inocentou direto. Lula não teve dele sequer presunção de inocência. Foi condenado antes de começar o julgamento. Foi condenado por Moro na opinião pública”, escreveu a presidenta do PT.
Silêncio no clã
A família Bolsonaro tem dado poucas explicações sobre o caso. O próprio Flávio, publicou em uma rede social no dia 6 de dezembro: “Fabrício Queiroz trabalhou comigo por mais de dez anos e sempre foi da minha confiança. Nunca soube de algo que desabonasse sua conduta. Em outubro foi exonerado, a pedido, para tratar de sua passagem para a inatividade. Tenho certeza de que ele dará todos os esclarecimentos”.
No dia 8 de dezembro, em conversas com jornalistas, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, afirmou que é amigo de Fabrício Queiroz há 34 anos e que o cheque de R$ 24 mil pago à futura primeira-dama seria uma devolução de parte de um empréstimo de R$ 40 mil, feito por ele próprio ao motorista.
“Se eu errei, eu arco com minha responsabilidade perante o Fisco, sem problema nenhum” disse Bolsonaro, ao ser questionado sobre o fato de não ter declarado o valor do suposto empréstimo à Receita Federal.
Para Pimenta, as explicações são insuficientes: “O clã Bolsonaro se caracterizou nesse último período pela presença assídua nas redes sociais, principalmente no Twitter. Todos os dias, comentando notícias de jornal, respondendo a jornalistas, opinando sobre tudo. Faz uma semana que eles se calaram, sumiram, despareceram. E veja bem: se há uma resposta convincente, porque já não deram para matar o assunto? O problema é que eles não sabem o que responder, pois as provas vão aparecer”
Na nova estrutura ministerial proposta pela equipe de transição de Jair Bolsonaro, o Coaf, passa ao controle do Ministério da Justiça, pasta que será comandada pelo ex-magistrado de primeira instância, Sérgio Moro.
Fonte: Brasil de Fato