Projeto de José Serra em 2010 já prometia entregar o pré-sal
A aprovação na Câmara do Projeto de Lei 8.939/2017 de autoria do deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) é apenas mais um capitulo do golpe que se iniciou pelo menos há sete anos.
Por Helena Sthephanowitz
Não demorou muito para aparecer a verdadeira “preocupação” de Serra com a Petrobras: sua ligação com os Estados Unidos veio à tona em meio às revelações do Wikileaks
Em 2010, o senador José Serra do PSDB foi candidato à presidência da República. Naquele ano, o tucano se declarou contra o PL 12.267/2010 enviado ao congresso pelo presidente Lula.
A lei aprovada autorizou a União a “ceder” para a Petrobras o direito de produzir até 5 bilhões de barris de petróleo em grandes áreas do pré-sal; em contrapartida, a Petrobras teria o ônus de repassar o valor correspondente a essa quantidade de barris para a União em forma de ações preferenciais da empresa. O projeto de José Serra, que mais parece ter sido redigido no departamento jurídico de alguma petroleira estrangeira, representou o PSDB, as petroleiras do exterior e os aliados dos tucanos, já que todos os líderes de oposição ao governo do PT acompanharam o pensamento de Serra.
Não demorou muito para aparecer a verdadeira “preocupação” de Serra com a Petrobras: sua ligação com os Estados Unidos veio à tona em meio às revelações do Wikileaks. Os documentos vazados no final de 2009 reproduziam telegramas do consulado americano em São Paulo a Washington, segundo o qual Serra — então governador de São Paulo em final de mandado e candidato a presidente — se comprometia com uma executiva da petrolífera Chevron, a mudar as regras de exploração de petróleo no pré-sal, que o governo Lula havia aprovado no Congresso, caso fosse eleito.
“Deixa esses caras do PT fazerem o que eles quiserem. As rodadas de licitações não vão acontecer, e aí nós vamos mostrar a todos que o modelo antigo – do governo Fernando Henrique Cardoso – funcionava… E nós mudaremos de volta”, disse Serra à diretora de Desenvolvimento de Negócios e Relações da petroleira norte-americana Chevron, segundo relato do telegrama divulgado na época no WikiLeaks. Em 1997, no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, quando acabou o monopólio da Petrobras, a exploração de campos petrolíferos obedeceu a um modelo de concessão. Nesse caso, a empresa vencedora da licitação ficava dona do petróleo a ser explorado pagando royalties ao governo.
Com a descoberta dos campos gigantes na camada do pré-sal, o governo Lula mudou o modelo e o vencedor teria de partilhar o petróleo encontrado com a União, e a Petrobras tinha duas vantagens: ser a operadora exclusiva dos campos e ter, no mínimo, 30% de participação nos consórcios com as outras empresas. Na época, o vazamento da WikiLeaks, ganhou grande repercussão na mídia alternativa, enquanto a imprensa comercial comentava timidamente o caso, levando muitos brasileiros a desconfiar na veracidade das informações do jornalista Julian Assange.
Wikileaks mostrou também a preocupação dos EUA com uma possível vitória de Dilma na eleição.
O consulado americano avaliava que as descobertas de petróleo e o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) poderiam “turbinar” a candidatura de Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil. O consulado citava que o Brasil se tornaria um “player” importante no mercado de energia internacional.
Serra foi derrotado nas urnas por Dilma. Em 2014, foi eleito senador. Valendo-se do cenário em que a oposição já havia decidido pelo impeachment em 2015, José Serra apresentou o PL 131/2015, no Senado que alterava a Lei da Partilha (exatamente como, segundo os telegramas vazados, havia prometido às petrolíferas americanas). O projeto de José Serra reduzia a participação da Petrobras e ampliava a fatia das multinacionais do setor na exploração das reservas de petróleo da camada pré-sal.
Coincidentemente, na eleição de 2014 o candidato do PSDB, Aécio Neves, também defendeu o fim do modelo de partilha. As gigantescas multinacionais petrolíferas (Chevron, Shell, Texaco, Total, e outras) já cobiçavam o Pré-Sal.
O projeto do senador José Serra impulsionou o impeachment?
Por que a Total Petroleo, hoje dona de uma fatia da Petrobras, anunciou na TV Globo?
No período eleitoral de 2014 a Total, empresa de petróleo multinacional cuja sede é na França, vinculou propagandas na TV Globo.
Mas foi em 2016 que Temer mandou a Petrobras vender fatia de áreas no pré-sal para francesa
Total.
A Petrobras vendeu participações em áreas do pré-sal e usinas térmicas para a francesa Total. O acordo com a Total previa a venda de fatias em duas áreas que estão entre as mais promissoras do pré-sal, na Bacia de Santos. Com o acordo a Total passou a ter produção de petróleo no Brasil e seguindo os passos da Shell (estrangeira com maior presença no pré-sal) e a norueguesa Statoil
Muito estranho. Em 2014, a Total não atuava (e nem atua) no varejo no Brasil, não tinha e – não tem rede de postos – para anunciar em meios de comunicação de massa. Então o retorno em vendas, uma das razões de ser da qualquer propaganda, seria zero.
Outro motivo mais justificável seria uma propaganda institucional. É comum quando a imagem da empresa sofre algum desgaste, por exemplo, quando há acidente com danos ambientais, ou que vitima trabalhadores, ou quando a empresa se vê envolvida em algum escândalo. Também não foi o caso da Total no Brasil. O retorno, neste caso, também seria zero.
Em países onde empresas estrangeiras são consideradas imperialistas por ficarem com a maior parte do lucro do petróleo, deixando muito pouco da riqueza para o povo, também é comum esse tipo de propaganda institucional para melhorar a imagem e fazer um contraponto neoliberal aos nacionalistas que pregam mudanças nos contratos. Mas no Brasil, a Total não tinha nenhum problema de má imagem desse tipo. Pelo contrario. Pouco se ouvia falar na petroleira.
Na época, petroleira francesa até aceitou participar da extração de petróleo no campo de Libra no pré-sal com participação minoritária, ao lado da majoritária Petrobras. Aceitou as regras de partilha, onde a fatia do leão da riqueza ficava com o povo brasileiro. Portanto, também não tinha esse tipo de problema, e o retorno da propaganda também seria zero.
Aliás, se a Total tivesse que fazer propaganda institucional seria em 2013, após participar do consórcio de Libra com a Petrobras. Ali seria hora de fazer uma propaganda comemorativa para marcar a presença institucional de investir no Brasil e esse blá-blá-blá corporativo que grandes empresas costumam fazer quando anunciam grandes investimentos, mesmo que não atuem no varejo.
Mais surpreendente é que a propaganda era internacional, não foi feita no Brasil, nem concebida para o Brasil. São visíveis cenas gravadas em países africanos, inclusive com placas em outros idiomas. No Youtube, quando pesquisamos, vemos que o anúncio existe dublado em diversas línguas.
Por que então anunciar na TV Globo?
Não se pode afirmar ao certo, mas que dá para desconfiar, isso dá. O único motivo que não fosse rasgar dinheiro é que os anúncios fossem uma forma de patrocínio à linha editorial das Organizações Globo para defender mudanças no modelo de partilha e enfraquecimento da Petrobras, de forma que as petroleiras privadas estrangeiras ficassem com uma fatia maior da riqueza do pré-sal. Como está ocorrendo hoje, quatro anos depois.
Só dava para ver retorno financeiro para a Total nesse tipo de propaganda se a pregação da Globo desse como certo contra a Petrobras e contra o modelo de partilha no pré-sal, onde cerca de 80% da riqueza ficavam para o povo brasileiro.
Já em 2014, o presidente da Total, em entrevistas, defendia o fim da exclusividade da Petrobras no pré-sal. Os jornais e telejornais da Globo também defendia a mesma coisa. Juntava a fome de um com a vontade de comer do outro.
Não é proibido nem ilegal anunciar com objetivo de patrocinar linhas editoriais que atendam ao lobismo corporativo. Mas o povo brasileiro tem o direito de saber qual é o jogo político pesado em torno da riqueza do pré-sal que foi jogado na telinha da TV Globo.