Com desmonte no setor e alta no gás, 1,2 mi apelam a carvão ou lenha
Com o preço do gás de cozinha nas alturas – devido à atual política de sucessivos reajustes em função do valor no mercado internacional -, aumentou em 1,2 milhão o número de brasileiros que passaram a utilizar lenha e carvão para cozinhar. De acordo com dados do IBGE, subiu de 16,1% para 17,6% a parcela de lares que agora recorrem a estas alternativas. José Maria Rangel, presidente da Federação Única dos Petroleiros (FUP), associa o retrocesso ao desmonte na cadeia produtiva de óleo e gás.
A falta de acesso ao botijão de gás, além representar a precarização nas condições de vida da população, aumenta o risco de acidentes, expõe as famílias à fumaça e as cidades aos prejuízos ambientais. A combustão da lenha e carvão libera monóxido de carbono e micropartículas que são absorvidas pelos pulmões.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do IBGE, mostra que, em 2017, 12,3 milhões de domicílios usaram lenha ou carvão como combustível para cocção. O número representa um crescimento de 11% com relação aos 11,1 milhões de lares do ano anterior.
A disseminação do uso do combustível mais barato aconteceu em todas as regiões. No Norte, houve alta de 16% ou 239 mil domicílios. No Sudeste, a alta foi de 13% ou 244 mil domicílios.
Em números absolutos, o maior aumento foi no Nordeste, onde mais de 400 mil lares deixaram de fazer uso do gás de cozinha e o uso da lenha e do carvão passou de 22,1% para 24,1% dos domicílios.
Em junho de 2017, sob a orientação do governo Michel Temer e do presidente da estatal, Pedro Parente, a Petrobras mudou sua política para a venda do Gás Liquefeito de Petróleo (GLP). Atrelou seus preços à cotação do combustível no mercado europeu. A alteração provocou uma disparada nos valores do produto, que subiu, no ano passado, 67,8% nas refinarias para envase em botijões de 13 quilos, usado em residências.
Praticamente congelado durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o preço do botijão para o consumidor final ficou 16% mais caro em 2017. Foi a maior alta desde 2002. Em um momento no qual 13 milhões de brasileiros não tinham emprego, os reajustes pesaram no orçamento.
“Nos governos do PT, a Petrobras comprou a Liquigás [distribuidora de gás] e passou a ter participação nas distribuidoras estaduais e, de certa forma, regulava o mercado de gás no país. Como diz o ex-presidente Lula, o gás de cozinha faz parte da cesta básica do brasileiro, e esse é um setor muito especulativo. Então, de certa forma, o governo, através de suas empresas, conseguia regular”, afirmou José Maria Rangel.
Segundo ele, Temer e Parente têm atuado em sentido oposto, para desestruturar a cadeia de óleo e gás. “Eles desmontaram tudo. A Petrobras vendeu sua participação nas distribuidoras estaduais e agora passaram a praticar preços internacionais: subiu lá fora, sobre aqui. Isso fez com que o preço disparasse”, afirmou.
Em janeiro deste ano, quando as eleições presidenciais já se avizinhavam, a Petrobras anunciou uma mudança na política de preços. Reduziu em 5% o valor do gás de cozinha nas refinarias e passou a reajustar o valor do produto a cada três meses, ao invés de todo mês.
Para Rangel, a mudança veio tarde, em um momento no qual os preços já estão abusivos. “Há alguns lugares no país em que o botijão custa R$75, R$80. Não adianta muito essa mudança agora, quando o preço já está proibitivo. Eles baixaram 5% e vão realinhar a cada três meses. É uma tentativa de ficar bem na foto agora, mas congelaram o valor na alta”, condenou.
O petroleiro associa o que ocorre com o setor de óleo e gás no país aos interesses por trás do impeachment de Dilma Rousseff. “Para nós, essa é mais uma fatura do golpe. Não só aconteceu isso com o gás de cozinha, mas com os derivados de petróleo, a gasolina, o diesel”.
Na esteira do processo de desmonte, a Petrobras também colocou à venda a Liquigás. Numa primeira tentativa, a compra da distribuidora pela Ultragaz, contudo, foi vetada pelo Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade).
“Agora, as notícias são de que já há um consórcio de investidores estrangeiros que querem comprar, numa tentativa de descaracterizar uma reserva de mercado. O fato é que não tenho dúvidas de que eles vão vender. Não há compromisso algum em manter nada que ajude à população”, lamentou Rangel.
Questionado sobre os prejuízos para os consumidores acarretados pela venda da distribuidora, ele resumiu: “É o preço final, e o povo já está sentindo qual é o resultado dessas políticas”.