Agronegócio e mineradoras deixaram de pagar R$ 269 bilhões em impostos por isenção
Em vigor há mais de 20 anos, a Lei Kandir isenta do tributo ICMS, o Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços, empresas que exportem produtos primários, semielaborados ou serviços. Como o ICMS é um imposto estadual, a regra causa grande prejuízo nas contas dos estados.
Um estudo divulgado pela Fapespa, a Fundação Amazônia de Amparo aos Estudos e Pesquisas, aponta que, de 1997 a 2016, os estados brasileiros deixaram de arrecadar 269 bilhões de reais, segundo estudo divulgado pela Fundação Amazônia de Amparo aos Estudos e Pesquisas.
O presidente da Fapespa, Eduardo Costa, avalia que o Brasil vive uma grave crise federativa e que a Lei Kandir tem uma forte influência nesse cenário. Só em 2016, por exemplo, os estados deixaram de arrecadar R$ 25 bilhões.
“Eu não tenho dúvida que se esses R$ 25 bilhões tivessem sido repassados ao estados, eles teriam uma situação fiscal diferente”, considera.
Além do impacto fiscal, especialistas defendem que a Lei Kandir tem um impacto na estratégia de desenvolvimento do país. É o que diz Gérson Teixeira, ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária. Para ele, a lei ratifica a divisão internacional do trabalho, que atribui ao Brasil a condição de economia primária e exportadora.
“Ao você desonerar as exportações de bens primários e semielaborados, você está renunciando um desenvolvimento industrial de mais fôlego, e consolidando uma estratégia de primarização da economia”, avalia.
Gerson diz que os setores populares e pequenos agricultores precisam se engajar na regulamentação dessa legislação. Ele diz que, caso contrário, o agronegócio vai ficar cada vez mais fortalecido econômica e politicamente:
“Na medida em que você desonera os setores exportadores, você cada vez mais empodera esses setores e isso tem impacto na relação de poder no campo”, afirma.
Eduardo Costa diz que, desde o início da Lei que carrega o nome de seu autor, o ex-deputado federal Antônio Kandir, ex-ministro do Planejamento no governo de Fernando Henrique Cardoso, havia clareza de que a isenção da cobrança ICMS na exportação de bens primários iria afetar os estados.
Ele aponta que “em função disso, foi criado um dispositivo anexo para compensar paulatinamente os estados até que fosse, como previa a Lei, aprovada uma lei complementar que regulamenta os critérios de compensação aos estados. Isso não aconteceu e, desde 2002, houve um vazio legal, uma situação de insegurança jurídica e os estados, ano a ano, começaram a acumular perdas”.
Em 2013, o governo do estado Pará, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por omissão. Essa ação foi complementada por outros 15 estados e, em novembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF), julgou procedente e determinou que o Congresso edite uma lei até 14 de dezembro deste ano, estabelecendo critérios de compensação para os estados.
O próprio STF, no voto do ministro Gilmar Mendes, determinou que, caso o congresso não consiga editar, votar e aprovar a legislação no prazo corrente, os critérios de compensação seriam arbitrados pelo Tribunal de Contas da União.
“Eu entendo que o melhor cenário, portanto, é o congresso nacional se mobilizar, estabelecer prioridades e conseguir ainda ao longo desse exercício de 2017 votar e aprovar e colocar nas mãos do presidente [Michel Temer] o Projeto de Lei para ser sancionado”, ressalta Costa.
Ele acredita que caso o TCU decida, continuaria havendo um vazio legislativo que contemple a compensação dos estados por conta da falta de arrecadação do ICMS.
Brasil de Fato