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Ao lado de Lampião e Padre Cícero, Lula é figura mais presente em cordéis, diz autor

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Nova escola tenta popularizar temas políticos através da literatura de cordel - Créditos: Júlia Dolce

A grande popularidade do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva no Nordeste não é novidade. A região, que teve o maior desenvolvimento durante os 12 anos de governo do PT, também foi palco de vitórias históricas para os candidatos do partido. No entanto, as dimensões que Lula ocupa no imaginário nordestino ultrapassam os resultados eleitorais, e tomam facetas mais líricas.

Isso porque o retirante pernambucano é hoje uma das maiores personalidades retratadas na literatura de Cordel, importante marca da cultura popular do Nordeste. É o que afirma o cordelista Crispiniano Neto, entrevistado pelo Brasil de Fato durante a passagem da Caravana Lula pelo Brasil em Mossoró (RN), na última segunda-feira (29).

“Depois de Lampião, Padre Cícero, e Getúlio Vargas, Lula é o mais presente nos cordéis. Na verdade, acho que já supera Vargas”, opinou. Crispiniano é autor do livro “Lula na literatura de Cordel”, uma compilação de cordéis que retratam a história do ex-presidente, sendo a maioria de sua própria autoria.

“Eu fui fazendo cordéis desde a criação do PT e guardando os que os colegas faziam. Quando fui tomar posse como membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, no Rio de Janeiro, convidei Lula para participar e resolvi fazer o livro. Ele gostou e pediu para ser lançado em Brasília”, contou.

O lançamento do livro aconteceu em maio de 2009, depois de ser adiado e ter sua primeira edição esgotada. “Foi um evento, ele adorou. Lá eu fiz uma solicitação para o reconhecimento da literatura de cordel como Patrimônio Cultural Brasileiro”, disse.

Por conta do lançamento do livro de Crispiano, a assessoria parlamentar de Lula aprovou a criação de um prêmio de Literatura de Cordel, o prêmio Patativa do Assaré – em homenagem ao famoso poeta popular cearense – que teve sua primeira edição realizada em 2010, com 3 milhões de reais em prêmios.

O cordelista também é criador da Casa do Cantador, escola de Cordel que tem como objetivo trazer temas políticos e sociais para esse tipo de literatura. “O Cordel sempre foi muito conservador, machista, coronelista. O negro era sempre retratado como ladrão. Quando Lampião vai para o inferno no cordel só encontra negros, por exemplo. Aí, a partir da Casa do Cantador nós invertemos isso, com uma visão de esquerda, uma visão social, de revolução. Porque se é popular, entendemos que deve estar do lado da luta popular”, afirmou.

Crispiniano recebeu a reportagem na colorida casa de seu colega de profissão, o também conhecido cordelista Antônio Francisco Teixeira de Melo, onde mostraram uma série de cordéis políticos sobre a história de Zumbi dos Palmares e de Olga Benário. E também cordéis didáticos, explicando a Lei Maria da Penha e o Manifesto Comunista de Marx e Engels.

Antônio se tornou cordelista já adulto, aos 46 anos, e hoje ocupa a cadeira de Patativa do Assaré na Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Também conhecido por tratar de temas sociais e ecológicos em seus cordéis, ele conta que, como muitos novos cordelistas, se inspirou no amigo Crispiniano.

“Eu acho o máximo popularizar a política pelo cordel, isso está se tornando uma escola aqui em Mossoró. Tem cordelistas no Rio Grande do Norte, no Ceará, fazendo um trabalho muito bonito. Passou a ser literatura nas escolas também. Você vê que o Cordel vai onde está as pessoas, na casa delas. É uma literatura com métrica, rima, ritmo. O livro e capa dura é bonito, mas distante. O cordel está no mercado, na feira. Então, esse doce que o cordel tem por trás das palavras faz elas chegarem mais fácil nas pessoas, se a mensagem for boa. E eu acredito que ele muda as pessoas”, conta Antônio.

Antonio e Crispiniano recitaram cordéis no ato de recepção da Caravana Lula pelo Brasil em Mossoró. Em sua fala, Lula destacou que a Caravana tem como objetivo entender as muitas mudanças sociais que aconteceram na região, como o crescimento do número de estudantes universitários, com a interiorização das universidades, e a melhoria das consequências das secas, através da construção de cisternas.

Antônio, conhecido por ter realizado, durante sua juventude, uma série de jornadas de bicicleta por milhares de quilômetros do Nordeste, acredita que o contato direto com as populações do sertão nordestino é um diferencial do ex-presidente.

“Hoje, se eu for andar por onde andei talvez eu veja ainda mais, porque minha vista está ficando ruim, mas eu estou enxergando mais. Eu viajava fisicamente e espiritualmente. Conheci as pessoas, via a maneira delas me receberem, fazendo banquetes sem saber quem eu era. Aprendi muito. Lula está revivendo, voltando de onde saiu. Ontem, eu estava vendo quantas pessoas tinha no ato, de todos os cantos, e pensando o quanto ele virou um mito vivo. Acho que se ele precisa de autoestima e gasolina para continuar, essa foi a gasolina para ele”, disse.

Questionado sobre qual é seu cordel favorito, Antônio responde que é  “Meu Sonho”, poema escrito por ele que expõe um lugar utópico, onde não existe desigualdade e as pessoas vivem em harmonia com a natureza: “Quando chegamos na praça/ Eu parei, passei a mão/ Numa estátua de ouro/ Parecida com Sansão/ Só que, em vez de uma queixada/ Uma enxada na mão/ Eu perguntei para o homem/ – É de um parlamentar?/ Ele me respondeu/ Com um sorriso no olhar/ “É de um agricultor, / O nosso herói popular”.

Já Cipriniano tem entre seus favoritos um que fez a pedido do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) após a vitória de Lula para seu segundo mandato, em 2006: “Era para falar da coalizão tão ampla que Lula fez entre classes, que não conseguia fazer reforma agrária do jeito que queria. Então fiz um mote, que é ‘Entendemos que é bom coalizão, mas se for para fazer reforma agrária”, recitou.

O motivo para que esse verso esteja entre seus favoritos, explica, é porque ele mesmo é assentado da reforma agrária, através de um projeto governamental na Serra do Mel, que construiu casas para salineiros da região. Agrônomo, ele foi chamado para conscientizar os trabalhadores das salinas, demitidos após serem substituídos por máquinas. “O cordel faz parte dessa nossa luta”, lembra.

Brasil de Fato