Temer diz que impeachment é natural da democracia, juristas contestam
No dia em que o Senado deu início ao julgamento do processo de impeachment contra a presidenta eleita Dilma Rousseff, o presidente que ocupa interinamente o governo, Michel Temer (PMDB), afirmou nesta quinta-feira (25) que, na opinião dele, o impeachment é uma coisa “natural da democracia”.
Por Dayane Santos
O usurpador deu a declaração aos jornalistas após participar da cerimônia de recepção da tocha paralímpica no Palácio do Planalto. Questionado sobre se estava “nervoso” e “inseguro” com o julgamento final da presidenta, Temer afirmou: “Isso [impeachment] é uma coisa tão natural da democracia”.
Juristas ouvidos pelo Portal Vermelho rebateram a afirmação de Temer, que é formado em Direito e foi professor de Direito Constitucional.
Para o professor emérito da USP, Dalmo Dallari, a afirmação de Temer “é um absurdo”, porque o “impeachment é uma exceção à normalidade democrática”.
“E exatamente por ser uma exceção tem regras muito precisas estabelecidas na Constituição, que estabelece a possibilidade, mas fixa regras. É interessante chamar a atenção para um aspecto relacionado a esse tipo de argumento. Seguindo esse argumento, então nós podemos dizer que a prisão é uma coisa natural porque está prevista na Constituição. Vamos sair prendendo qualquer pessoa porque está previsto? É absurdo!”, salientou.
Dallari reforça que o impeachment tem previsão constitucional, mas “não é para utilizar arbitrariamente”.
“Exatamente porque é uma exceção à normalidade constitucional é indispensável que sejam obedecidas com rigor as exigências da Constituição. É alguma coisa que se deve usar excepcionalmente porque ainda que haja bom fundamento jurídico, acarreta prejuízos muito graves à normalidade política e social, de maneira que é uma exceção. Em hipótese alguma deve-se recorrer a isso se não houver uma fundamentação jurídica muito clara e indiscutível, o que não acontece no presente momento”, frisou o jurista.
Gilberto Bercovici, doutor em Direito do Estado e também professor da USP, destacou que apesar de previsto, o impeachment foi um mecanismo poucas vezes utilizado em todo o mundo, desde que foi criado no EUA.
“Quantos impeachments tivemos na história? Nos EUA, que foi o país que inventou o impeachment, ocorreu apenas duas vezes, um no século 19 e outro no governo Clinton, e em nenhum deles terminou com o afastamento efetivo. Na Argentina nunca teve. No México nunca teve. Na França nunca teve. Na Venezuela teve uma vez. E no caso do Collor foi, até então, o primeiro caso de impeachment no período moderno”, lembrou o professor.
E completou: “O que ele [Temer] deve achar que é normal é o problema sério do nosso sistema político e, talvez da própria Constituição. Em apenas 30 anos da promulgação da Constituição de 1988 é o segundo processo de impeachment de presidente da República. Mas isso também não é natural”.
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