Carol Canegal, coordenadora do Observatório da Branquitude, diz que “estudo pode ser interpretado como uma espécie de metonímia do quadro de desigualdades no país”
Publicado pelo Portal Vermelho
O Observatório da Branquitude lançou o estudo “A cor da infraestrutura escolar: diferenças entre escolas brancas e negras” que traz como resultado a seguinte constatação: as infraestruturas de escolas públicas com maioria de alunos negros são piores do que nas escolas em que a maioria de alunos são brancos.
O levantamento, que utiliza dados do Censo Escolar 2021, mostra que há bibliotecas em 55,29% das escolas de maioria de branca, laboratórios de informática em 74,69%, quadras de esportes em 80,33% e rede de esgoto em 72,28%.
Por outro lado, nas escolas negras há somente bibliotecas em 50,20%, laboratórios de informática em 53,10%, quadras de esportes em 51,79% e rede de esgoto em 56,56%.
Ao se olhar o todo, 69% das escolas da educação básica com melhor infraestrutura no Brasil são majoritariamente brancas, aponta o material.
Para comparação foi considerado “escolas predominantemente brancas, com 60% ou mais de alunos autodeclarados brancos (relacionadas um total de 12.376); e escolas predominantemente negras, com 60% ou mais de alunos autodeclarados negros (21.992 escolas)”.
Ao Portal Vermelho, a coordenadora de pesquisa do Observatório da Branquitude, Carol Canegal, entende que o “estudo pode ser interpretado como uma espécie de metonímia do quadro de desigualdades no país, sobretudo porque revela uma combinação nefasta entre variáveis como cor e raça, nível socioeconômico e localização geográfica a partir de um olhar sobre aspectos de infraestrutura das escolas de educação básica”.
Conforme explica, “a persistência desse arranjo de assimetrias segue em atividade entre nós e perpetua, em ambiente democrático, o favorecimento a certos grupos, em especial grupos brancos, de maior renda, localizados em regiões como Sudeste e Sul, em detrimento de grupos não brancos, pobres e situados nas regiões Norte e Nordeste”, completa.
Índice socioeconômico
A abordagem ainda avalia o índice socioeconômico (INSE), com indicador de 1 a 7, com o maior valor como indicativo de melhores condições da família, ao cruzar informações sobre bens e escolaridade dos familiares dos alunos.
Neste quesito, nas escolas negras, conforme o Observatório, 75% dos alunos estão nos níveis 3 e 4: “Nestes níveis, os estudantes relatam ter em casa uma televisão, um banheiro, wi-fi. No nível 4, os alunos responderam possuir em casa dois ou mais celulares. Em ambos os níveis, a escolaridade da mãe/responsável varia entre o 5º ano do ensino fundamental completo e o ensino médio completo”, coloca o estudo.
Já nas escolas brancas 88% dos estudantes estão nos níveis 5 e 6: “Nestes níveis os alunos relatam ter em casa um carro, uma ou duas televisões, um ou dois banheiros, wi-fi, entre outros bens. Nos níveis V e VI, a escolaridade da mãe/responsável varia entre o ensino médio e o ensino superior completo.”
Como traz os resultados, em escolas negras os alunos estão em níveis socioeconômicos inferiores. A esta constatação estão atreladas diferenças regionais e econômicas, no entanto não deixa de conter um elemento duplamente perverso: alunos mais carentes têm infraestrutura pior nas escolas.
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Com isso, a escola não representa aos estudantes um ambiente acolhedor, de oportunidade, de suprimento do que às vezes não possuem no ambiente familiar, ou seja, o Estado tem falhado nesta função.
Sobre estas dificuldades enfrentadas no dia a dia da educação básica, Canegal aponta que “certamente podem se materializar de várias maneiras de modo a impactar negativamente tanto trajetórias escolares, quanto trajetórias de vida”.
A coordenadora lembra que o Brasil experimentou avanços significativos no que concerne à ampliação do acesso à educação desde os anos 1980, quando se iniciou o processo de massificação da educação escolar entre nós. Antes restrita à maior parte das pessoas negras e demais grupos racializados, a oportunidade de acessar a escola se tornou pública há pouco mais de 40 anos no Brasil.
“Porém, ainda que tenhamos experimentado melhorias, permanece o desafio não mais exatamente do acesso à escola, atualmente universalizado, mas o desafio da permanência dos estudantes no jogo escolar. Para tanto, compreender os cenários dentro e fora da escola se faz importante para interferir intencionalmente na produção e reprodução dessas desigualdades”, elucida.
Correção de assimetrias
Na conclusão do estudo é indicado: “A correção de assimetrias pela via de políticas públicas assertivas segue como um caminho fundamental para a distribuição equitativa do direito à educação e, por conseguinte, para a produção de escolas com equipamentos e serviços adequados também para negros, demais povos racializados e brancos.”
A partir deste indicativo, o Observatório enxerga que, de acordo com Canegal, “o recado mais geral da pesquisa é o de que a variável cor/raça importa”.
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Segundo entende, é necessário pensar e atuar em prol da igualdade de oportunidades de maneira intencional na educação básica, juntamente com as demais variáveis importantes no contexto brasileiro, como renda e território, entre outras. Por isso é fundamental eleger a raça como marcador crucial para o desenho e formulação de políticas públicas educacionais e também para as demais funções de governo e Estado, sabendo que a educação, por ela mesma, não dá conta de nossas mazelas históricas.
“Conferir centralidade à raça sem dispensar outros marcadores da diferença abarca o potencial de rompimento de ciclos de produção e reprodução de assimetrias que, no limite, atuam contra a escolarização de tantas e tantos estudantes a despeito dos esforços e da dedicação dos profissionais da educação para mantê-los no jogo escolar”, completa.
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