A retomada das relações diplomáticas com a Venezuela, parte essencial da estratégia de integração sul-americana articulada pelo governo Lula a partir da cúpula da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), nesta semana, foi duramente criticada pela mídia corporativa. Ao invés de tratar do fortalecimento do bloco de países que integram o continente, veículos brasileiros optaram por demonizar Nicolás Maduro, presidente de uma das maiores economias da região.
No processo, atacaram Lula por ter uma agenda de soberania para a América do Sul, em uma guerra de narrativas e poucos fatos. Lula foi particularmente criticado por ter sugerido a Maduro construir uma “narrativa” diferente daquela imposta pelos países do Ocidente, que se acomodam no discurso hipócrita de que a Venezuela é uma ditadura e não merece o respeito de “democracias” mundo afora. A realidade, no entanto, é um pouco diferente.
Em artigo publicado no portal 247, o sociólogo, especialista em Relações Internacionais e assessor da liderança do PT no Senado, Marcelo Zero, jogou luzes sobre o assunto. Zero começou por apontar que a Venezuela não é o único país a ter problemas com direitos humanos. Ao contrário. “Assim como a Venezuela tem, a grande maioria dos países do mundo também tem, em maior ou menor grau”.
O sociólogo utilizou dados da prestigiada revista britânica The Economist para demonstrar que o planeta é bem menos democrático do que parece.
“Segundo essa publicação, somente 24 países do mundo, entre os 167 pesquisados, seriam “democracias plenas”. O resto se divide entre as categorias de “democracias imperfeitas” ou falhas, “regimes híbridos” e “regimes autoritários”. O Brasil, observe-se, não entra na lista das democracias plenas, discorre Zero.
“Conforme a The Economist, a maior parte da população do planeta não vive em democracia”, indica o especialista. “95 países, que somam quase 55% da população do globo, vivem em regimes “híbridos” ou “autoritários”, como seria o da Venezuela, conforme a publicação”, demonstra ele, no artigo.
“Por conseguinte, caso fôssemos nos relacionar somente com países considerados democráticos, segundos os padrões impostos pelo “Ocidente”, nossa diplomacia teria de se circunscrever a poucas nações do mundo”, justifica o sociólogo. “Teríamos de dar adeus, por exemplo, a qualquer protagonismo significativo na África e no Oriente Médio. Fato incontestável”.
Venezuela, uma das maiores economias da América do Sul
“A Venezuela está entre as quatro maiores economias da América do Sul, junto com Brasil, Argentina e Colômbia”, explica a secretária Executiva do Foro de São Paulo, Mônica Valente. “Apenas esse fato já demonstra a importância do reatamento das relações de cooperação econômica , comercial e social entre nossos países”, ressalta Valente.
A secretária criticou o comportamento da mídia hegemônica ao tratar da visita de Maduro no âmbito da reunião da UNASUL. “Ao invés de noticiar o amplo acordo de cooperação entre Brasil e Venezuela, a mídia brasileira se dedicou a repetir a cantilena adotada pelo Departamento de Estado dos EUA, como bem lembrou o jornalista e ex-ombudsman da Folha Mário Vitor dos Santos”, critica Valente.
Sanções catastróficas
Apesar de ser uma potência regional, a Venezuela paga o preço por centenas de sanções econômicas impostas pelas nações desenvolvidas, em especial os Estados Unidos. O efeito é um verdadeiro desastre humanitário no país. Na última década, as sanções e a volatilidade dos mercados internacionais derrubaram a produção de petróleo na região, o maior ativo econômico do país.
A restrição às exportações do país provocaram um cenário caótico de fome e miséria que já causou a morte de milhares de venezuelanos.
“Para um país no qual o petróleo respondia por 90% do valor das exportações e por mais da metade da receita fiscal, tal queda teve um impacto enorme”, aponta Zero. “A situação saiu do controle quando os EUA e a Europa passaram a impor sanções draconianas contra a Venezuela, a partir de 2017”. Como diz o especialista, trata-se de fato, não de narrativa.
“Qual a melhor maneira de propugnar pela democracia e os direitos humanos no cenário mundial? Pela via violenta, e frequentemente seletiva e hipócrita, do isolamento, das intervenções militares e políticas e das sanções econômicas e comerciais, que provocam tragédias humanitárias terríveis, ou pela pacífica das negociações e da cooperação, respeitado o princípio da não intervenção?”, indaga o sociólogo.
“Historicamente, a diplomacia brasileira tem apostado, de forma acertada, nessa última via”, conclui Marcelo Zero, ao apontar o caminho adotado pelo governo Lula nas relações com importantes economias sul-americanas.
Leia o artigo de Marcelo Zero na íntegra aqui.
Saiba mais sobre os atos de cooperação firmados entre Brasil e Venezuela.
Da Redação