“O ex-presidente do Brasil não deveria ter o luxo de estar de férias nos EUA, tirando fotos da Flórida e fingindo que não está envolvido nos ataques à democracia”, diz congressista americano.
Publicado pelo Portal Vermelho
Deputados americanos pretendem se reunir nesta semana para discutir um pedido de deportação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que está na Flórida e já é considerado persona non grata no país. Boa parte da bancada do Partido Democrata apoia a ideia de tirar o ex-presidente golpista dos EUA para que ele possa ser investigado e eventualmente julgado por seu papel nos ataques contra a democracia no Brasil. A presença de Bolsonaro no país, desta forma, tornou-se um enorme constrangimento para o presidente dos EUA, Joe Biden.
Dois congressistas pediram publicamente a deportação de Bolsonaro –Joaquín Castro, que representa a minoria democrata no Comitê de Hemisfério ocidental, e Alexandria Ocasio Cortez (AOC). À CNN Castro afirmou que “os EUA não deveriam ser um refúgio para o autoritário que inspirou terrorismo doméstico no Brasil”. Já Alexandria, no Twitter, afirmou: “Os EUA precisam deixar de dar guarida a Bolsonaro”.
O democrata Raúl Grijalva também se manifestou defendendo a ideia da deportação. Ele afirmou ainda que a extradição também seria uma opção, caso o governo brasileiro faça um pedido. “O Brasil tem uma democracia que merece ser defendida, e estamos prontos para ajudar.”
Bolsonaro saiu do Brasil no último dia 30 de dezembro, antes do fim de seu mandato, mesmo acompanhando de perto a efervescência golpista em acampamentos em frente a quartéis do Exército. Rompendo uma tradição democrática, decidiu não passar a faixa para Lula e se instalou na região de Orlando, sudeste dos EUA.
Deportação e extradição
A ideia dos congressistas americanos é pedir à Casa Branca que inicie o processo. “É preciso tirar Bolsonaro dos EUA para que enfrente no Brasil as consequências de ter instigado os ataques à democracia no Brasil, de forma semelhante ao que o ex-presidente Donald Trump fez nos EUA e que culminou [na invasão] no Capitólio”, disse Grijalva, em entrevista à Folha de S. Paulo. “Os brasileiros e a democracia do país têm o direito de julgar a responsabilidade de Bolsonaro.”
O maior ataque recente à democracia americana foi classificado por muitos como uma tentativa de golpe de Estado e se tornou alvo de uma série de investigações, do Departamento de Justiça, do FBI e do próprio Congresso. O ataque resultou na morte de cinco pessoas, entre os quais um policial.
De acordo com Grijalva, basta uma decisão da Casa Branca e do Departamento de Segurança Doméstica, órgão que, para o democrata, decide “deportar inúmeras pessoas todos os dias, inclusive brasileiros pedindo refúgio com motivos legítimos para tal, mas que estão encurralados na fronteira com o México”.
O processo de extradição depende da solicitação pelo Judiciário brasileiro e, então, encaminhada pelo governo federal ao americano —que pode ou não aceitá-lo. A extradição só pode acontecer caso exista um acordo específico entre os dois países envolvidos, o que é o caso de Brasil e EUA, e depende de reciprocidade de penas.
A deportação, por sua vez, é um mecanismo mais rápido e depende exclusivamente da vontade do Estado no qual o ex-presidente agora se encontra. Caso tenha usado seu passaporte diplomático para entrar nos EUA, o ex-presidente teria 72 horas para deixar o país. Esta medida pode gerar desgaste diplomático para Washington.
Viabilidade
Para Bolsonaro ser deportado, basta apenas o governo local não o querer no território, porque o governo decidiu que ele é um incômodo para os EUA. Esta é a opinião do professor de Direito da UFBA e procurador Vladimir Aras. Nas redes sociais, ele diz que o procedimento é o mesmo adotado pelo Brasil e pode ocorrer mesmo que a pessoa tenha visto válido. Não se sabe se ele está como turista ou se foi com visto político.
“Deportação, expulsão e atos análogos são medidas migratórias discricionárias do Estado. Qualquer alienígena pode ser deportado. Mesmo um representante estrangeiro pode ser declarado ‘persona non grata’ e convidado a sair. Bolsonaro é um cidadão comum.”
O próprio porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, confirmou o que pode acontecer com alguém como Bolsonaro. “Se um indivíduo não tem base para estar nos Estados Unidos, ele está sujeito a deportação pelo Departamento de Segurança Nacional”, foi a resposta sucinta a questionamento da imprensa sobre o assunto.
Golpismo de exportação
“O ex-presidente do Brasil não deveria ter o luxo de estar de férias nos EUA, tirando fotos da Flórida e fingindo que não está envolvido nos ataques à democracia. Ele precisa ser responsabilizado”, disse. “Devemos fazer com ele o que o governo Trump sempre fazia com migrantes –removê-lo do país.”
O democrata afirma que essa seria uma oportunidade para o presidente Joe Biden provar que sua defesa da democracia é consistente. O presidente americano realizará a segunda edição da Cúpula para a Democracia, nos EUA, no final de março. “O que aconteceu no dia 6 de janeiro de 2021 nos EUA está sendo exportado, e o Brasil é o exemplo mais gritante; Biden deveria enviar a mensagem de que estamos comprometidos com a defesa da democracia não apenas no nosso país.”
Para o congressista, as ligações entre as duas insurreições são inegáveis –elas compartilham a mesma narrativa de eleição roubada e fomentam ressentimentos políticos e culturais, além de mentiras que “criaram o que vimos neste domingo em Brasília e o que vimos no 6 de Janeiro dois anos atrás”.
Chances de prisão
Segundo coluna de Malu Gaspar, em O Globo, aliados próximos de Bolsonaro temem a prisão do ex-presidente na esteira dos atos terroristas na Praça dos Três Poderes. Eles avaliam que até a base popular de Bolsonaro deve se afastar de apoiá-lo, desde que ele viajou, enquanto os acampados enfrentavam intempéries na frente de quartéis.
No cálculo político de fiéis aliados, diz Malu, quanto mais vulnerável Bolsonaro estiver e menos apoio popular reunir, maiores as chances de ele se tornar uma “presa fácil” para o Judiciário e acabar na cadeia.
“Agora a leitura compartilhada por aliados do ex-presidente e ministros de tribunais superiores é de que a situação de Bolsonaro ficou delicadíssima. ‘Eu acho que, a médio prazo, ele não escapa’, disse um magistrado que acompanhou perplexo os atos”, diz trecho da coluna.
Segundo a colunista, os aliados e magistrados apostam que os atos terroristas irão minar o capital político do ex-presidente, já desgastado nos últimos meses, após omissão enquanto extremistas estavam acampados em frente a quartéis das Forças Armadas. “Se Bolsonaro virar um avestruz e fingir que nada disso que está acontecendo é com ele, vai ter problemas”, diz um interlocutor do ex-presidente.
O maior temor é com as investigações vindas do STF, nas mãos do ministro Alexandre de Moraes, sob o inquérito das fake news e das milícias digitais.
Foi no âmbito desses dois inquéritos que a Advocacia-Geral da União (AGU), comandada por Jorge Messias, pediu a Moraes a prisão de todos os envolvidos na invasão de prédios públicos federais, inclusive a do ex-secretário de segurança pública do DF Anderson Torres. A quebra de sigilo telefônico dos envolvidos na baderna pode levar a descobertas inesperadas.
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