“A partir de 1º de janeiro de 2023, vou governar para 215 milhões de brasileiros”, afirmou Lula, em São Paulo, em seu primeiro discurso após ser eleito presidente do Brasil, neste domingo (30), com mais de 60 milhões de votos (assista e leia a íntegra abaixo).
“Somos um único país, um único povo, uma grande nação”, completou Lula, que pregou a união dos brasileiros. “É hora de reunir de novo as famílias, refazer os laços de amizade rompidos. (…) Este país precisa de paz e de união.”
Antes de ler o discurso preparado para este “30 de outubro histórico”, Lula agradeceu a Deus e “a cada companheiro e cada companheira que tiveram um papel importante na campanha, sobretudo as pessoas que vieram no segundo turno”.
Em seguida, tendo ao seu lado lideranças políticas que representam a grande frente democrática que se uniu em torno da chapa Lula-Alckmin, o agora presidente eleito iniciou a leitura, em um salão abarrotado de jornalistas de todos os cantos do mundo.
Logo no início, afirmou que as eleições têm “um único e grande vencedor: o povo brasileiro”. “Esta não é uma vitória minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha. É a vitória de um imenso movimento democrático que se formou, acima dos partidos políticos, dos interesses pessoais e das ideologias, para que a democracia saísse vencedora.”
E Lula explicou o que considera ser a democracia real. Democracia, disse, é mais do que o direito de protestar contra a fome, o desemprego, o salário insuficiente. Democracia é o povo viver bem, comer bem, morar bem.
“É assim que eu entendo a democracia. Não apenas como uma palavra bonita inscrita na Lei, mas como algo palpável, que sentimos na pele, e que podemos construir no dia-dia. E é essa democracia que nós vamos buscar construir a cada dia do nosso governo”, prometeu.
Por isso, o combate à fome será, mais uma vez, a prioridade de seu novo governo. Assim como a geração de empregos, a valorização do salário mínimo, a retomada do Minha Casa Minha Vida, o apoio aos pequenos e microempresários. E também o respeito ao meio ambiente e a busca da reindustrialização aliada ao desenvolvimento sustentável, bem como a valorização da saúde, da educação, da ciência e da cultura.
E concluiu dizendo que precisará da ajuda de toda a sociedade para alcançar esses objetivos. “Volto a dizer aquilo que disse durante toda a campanha. Aquilo que nunca foi uma simples promessa de candidato, mas sim uma profissão de fé, um compromisso de vida: O Brasil tem jeito. Todos juntos seremos capazes de consertar este país e construir um Brasil do tamanho dos nossos sonhos – com oportunidades para transformá-los em realidade.”
Leia a íntegra do discurso de Lula:
Meus amigos e minhas amigas.
Chegamos ao final de uma das mais importantes eleições da nossa história. Uma eleição que colocou frente a frente dois projetos opostos de país, e que hoje tem um único e grande vencedor: o povo brasileiro.
Esta não é uma vitória minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha. É a vitória de um imenso movimento democrático que se formou, acima dos partidos políticos, dos interesses pessoais e das ideologias, para que a democracia saísse vencedora.
Neste 30 de outubro histórico, a maioria do povo brasileiro deixou bem claro que deseja mais – e não menos democracia.
Deseja mais – e não menos inclusão social e oportunidades para todos. Deseja mais – e não menos respeito e entendimento entre os brasileiros. Em suma, deseja mais – e não menos liberdade, igualdade e fraternidade em nosso país.
O povo brasileiro mostrou hoje que deseja mais do que exercer o direito sagrado de escolher quem vai governar a sua vida. Ele quer participar ativamente das decisões do governo.
O povo brasileiro mostrou hoje que deseja mais do que o direito de apenas protestar que está com fome, que não há emprego, que o seu salário é insuficiente para viver com dignidade, que não tem acesso a saúde e educação, que lhe falta um teto para viver e criar seus filhos em segurança, que não há nenhuma perspectiva de futuro.
O povo brasileiro quer viver bem, comer bem, morar bem. Quer um bom emprego, um salário reajustado sempre acima da inflação, quer ter saúde e educação públicas de qualidade.
Quer liberdade religiosa. Quer livros em vez de armas. Quer ir ao teatro, ver cinema, ter acesso a todos os bens culturais, porque a cultura alimenta nossa alma.
O povo brasileiro quer ter de volta a esperança.
É assim que eu entendo a democracia. Não apenas como uma palavra bonita inscrita na Lei, mas como algo palpável, que sentimos na pele, e que podemos construir no dia-dia.
Foi essa democracia, no sentido mais amplo do termo, que o povo brasileiro escolheu hoje nas urnas. Foi com essa democracia – real, concreta – que nós assumimos o compromisso ao longo de toda a nossa campanha.
E é essa democracia que nós vamos buscar construir a cada dia do nosso governo. Com crescimento econômico repartido entre toda a população, porque é assim que a economia deve funcionar – como instrumento para melhorar a vida de todos, e não para perpetuar desigualdades.
A roda da economia vai voltar a girar, com geração de empregos, valorização dos salários e renegociação das dívidas das famílias que perderam seu poder de compra.
A roda da economia vai voltar a girar com os pobres fazendo parte do orçamento. Com apoio aos pequenos e médios produtores rurais, responsáveis por 70% dos alimentos que chegam às nossas mesas.
Com todos os incentivos possíveis aos micros e pequenos empreendedores, para que eles possam colocar seu extraordinário potencial criativo a serviço do desenvolvimento do país.
É preciso ir além. Fortalecer as políticas de combate à violência contra as mulheres, e garantir que elas ganhem o mesmo salários que os homens no exercício de igual função.
Enfrentar sem tréguas o racismo, o preconceito e a discriminação, para que brancos, negros e indígenas tenham os mesmos direitos e oportunidades.
Só assim seremos capazes de construir um país de todos. Um Brasil igualitário, cuja prioridade sejam as pessoas que mais precisam.
Um Brasil com paz, democracia e oportunidades.
Minhas amigas e meus amigos.
A partir de 1º de janeiro de 2023 vou governar para 215 milhões de brasileiros, e não apenas para aqueles que votaram em mim. Não existem dois Brasis. Somo um único país, um único povo, uma grande nação.
Não interessa a ninguém viver numa família onde reina a discórdia. É hora de reunir de novo as famílias, refazer os laços de amizade rompidos pela propagação criminosa do ódio.
A ninguém interessa viver num país dividido, em permanente estado de guerra.
Este país precisa de paz e de união. Esse povo não quer mais brigar. Esse povo está cansado de enxergar no outro um inimigo a ser temido ou destruído.
É hora de baixar as armas, que jamais deveriam ter sido empunhadas. Armas matam. E nós escolhemos a vida.
O desafio é imenso. É preciso reconstruir este país em todas as suas dimensões. Na política, na economia, na gestão pública, na harmonia institucional, nas relações internacionais e, sobretudo, no cuidado com os mais necessitados.
É preciso reconstruir a própria alma deste país. Recuperar a generosidade, a solidariedade, o respeito às diferenças e o amor ao próximo.
Trazer de volta a alegria de sermos brasileiros, e o orgulho que sempre tivemos do verde-amarelo e da bandeira do nosso país. Esse verde-amarelo e essa bandeira que não pertencem a ninguém, a não ser ao povo brasileiro.
Nosso compromisso mais urgente é acabar outra vez com a fome. Não podemos aceitar como normal que milhões de homens, mulheres e crianças neste país não tenham o que comer, ou que consumam menos calorias e proteínas do que o necessário.
Se somos o terceiro maior produtor mundial de alimentos e o primeiro de proteína animal, se temos tecnologia e uma imensidão de terras agricultáveis, se somos capazes de exportar para o mundo inteiro, temos o dever de garantir que todo brasileiro possa tomar café da manhã, almoçar e jantar todos os dias.
Este será, novamente, o compromisso número 1 do nosso governo.
Não podemos aceitar como normal que famílias inteiras sejam obrigadas a dormir nas ruas, expostas ao frio, à chuva e à violência.
Por isso, vamos retomar o Minha Casa Minha Vida, com prioridade para as famílias de baixa renda, e trazer de volta os programas de inclusão que tiraram 36 milhões de brasileiros da extrema pobreza.
O Brasil não pode mais conviver com esse imenso fosso sem fundo, esse muro de concreto e desigualdade que separa o Brasil em partes desiguais que não se reconhecem. Este país precisa se reconhecer. Precisa se reencontrar consigo mesmo.
Para além de combater a extrema pobreza e a fome, vamos restabelecer o diálogo neste país.
É preciso retomar o diálogo com o Legislativo e Judiciário. Sem tentativas de exorbitar, intervir, controlar, cooptar, mas buscando reconstruir a convivência harmoniosa e republicana entre os três poderes.