Por Osvaldo Bertolino
O programa de governo das classes dominantes nunca absorveu essa modernização. Agora, com o golpe de mão da “reforma” trabalhista, uma das mediadas mais nefastas para os trabalhadores em toda a história dessa relação, o capital se sente com força para acabar de vez com essas medidas modernizadoras. Foi o que fez o presidente eleito, Jair Bolsonaro, ao dizer que “a lei trabalhista tem que se aproximar da informalidade”, uma proposta concreta para a sua tese de que “ser patrão no Brasil é um tormento”.
É uma visão tipicamente totalitária, alinhada com os desígnios do projeto neoliberal radicalizado, anunciado por seu superministro da economia, Paulo Guedes. Eles propõem nada menos do que a revisão do artigo 7º da Constituição — que trata de direitos como a previsão do pagamento de 13º salário, férias, salário mínimo, entre outros pontos —, uma das mais sagradas conquistas dos trabalhadores brasileiros, resultado de lutas que atravessaram o século XX.
Redução da jornada
Para se avaliar a gravidade dessa tese para os trabalhadores é necessário considerar dois aspectos importantes das relações de trabalho: a produtividade e a tecnologia. Sobre eles há, evidentemente, dois pontos de vista distintos — o do capital e o do trabalho. E esses aspectos estão, por assim dizer, no âmago das relações econômicas, políticas e sociais desde que o homem deixou de ser nômade e passou a criar e a acumular riquezas.
A história do avanço da humanidade, do tempo em que se lascava pedra até os dias atuais — em que se produz microprocessadores capazes de lidar com informações de forma mais rápida do que o próprio cérebro —, é a do esforço para elevar a produtividade. Esse conceito é, portanto, do ponto de vista econômico, a régua essencial que mede o progresso do homem e um ponto de partida para se entender a relação capital-trabalho.
Uma primeira questão que aparece aqui é a justeza da histórica luta dos trabalhadores pela redução da jornada de trabalho. Essa batalha é justa porque, em primeiro lugar, um menor número de horas trabalhadas significa melhor distribuição da riqueza produzida. É a ideia de menos horas de trabalho, mais gente trabalhando e obtendo renda — melhorando, assim, o acesso ao consumo. E, em segundo lugar, porque essa é uma forma de não deixar o trabalhador fora dos benefícios que o inevitável investimento teconológico trará.
Estado de Direito
Com um detalhe: hoje a economia é medida não apenas por aquilo que numericamente se é capaz de produzir, mas principalmente por aquilo que dá mais valor ao produzido, aquilo que efetivamente mostra o grau de técnica e de ciência contido no produto final. A intenção, com essas medidas neoliberais, é reforçar a categoria do “precariado”, termo formado com a combinação do adjetivo “precário” com o substantivo “proletariado”. Como explica Guy Standing — economista formado na Inglaterra e nos Estados Unidos, que trabalhou por muitos anos na Organização Internacional do Trabalho (OIT), autor de livros sobre globalização, sindicalismo, desigualdades e ecologia — o termo “precariado” é muito diferente de “proletariado”.
O nome “precariado” apareceu pela primeira vez em 1980 para se referir aos trabalhadores temporários ou sazonais, mas o conceito foi evoluindo, cabendo a Standing o mérito de o trazer para o âmbito acadêmico. Segundo ele, o termo “proletariado” refere-se ao trabalhador que foi “deliberadamente proletarizado para que fornecesse trabalho estável em contrapartida de salários, benefícios e contratos coletivos”.
O “precariado” está habituado a ver o trabalho como instável por natureza, “uberizado”, sem local de trabalho ou horários, realizando trabalhos com qualidade muito inferior às suas qualificações, não têm nenhuma certeza sobre o rumo a dar à sua vida e têm de se sustentar, normalmente, só com salários em dinheiro, enquanto o proletariado recebe parte do seus rendimento em benefícios laborais e sociais. Como resultado, o “precariado” perde os direitos de cidadão num Estado de Direito, percorrendo um caminho inverso ao do proletariado.
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