Por Joana Rozowykwiat
Entre os 264 deputados que se pronunciaram contra o prosseguimento da denúncia de corrupção passiva que envolve o presidente Michel Temer na Câmara, raros foram os que tiveram coragem de fazer a defesa do peemedebista. Em muitos casos, a justificativa do voto contrário à admissibilidade da investigação foi a necessidade de estabilidade econômica.
Descolados da realidade do país, os parlamentares assimilaram o discurso otimista e estapafúrdio do governo, facilmente desmontado quando se analisam os indicadores econômicos. É como se vivessem em um país diferente daquele que assiste à deterioração do mercado de trabalho, da renda, do consumo, da indústria e mesmo da confiança, essa entidade na qual o presidente denunciado apostou todas as suas fichas.
Depois de ter alcançado 14,2 milhões de desempregados em abril, em junho o país contabilizou um recuo nesse número. Mas, de acordo com o IBGE, houve queda das vagas com carteira assinada. Diversos economistas veem, na verdade, uma estabilização do desemprego e analisam que a precarização e a desistência na busca por trabalho explicam a melhoria do indicador.
Os dados menos negativos teriam sido impulsionados pelo bom desempenho da agricultura e pelo aumento do trabalho informal, algo que a reforma trabalhista, aprovada e sancionada recentemente, só deve intensificar.
A tese – repetida à exaustão pelo governo – de que o país já está saindo da recessão não se sustenta em análises mais apuradas. A equipe econômica celebrou efusivamente o PIB do primeiro trimestre de 2017, que apresentou uma expansão de 1%. Mas, em relação ao mesmo período do ano passado, a economia teve retração de 0,4%, apontou o IBGE. E o resultado acumulado dos quatro últimos trimestres, terminados em março, registrou queda de 2,3%.
Além disso, o discreto aumento ocorreu sobre uma base muito deprimida. “Se olharmos no longo prazo, ainda estamos no mesmo nível de 2010”, disse a própria coordenadora de contas do IBGE, Rebeca Palis, ao divulgar os números.
Mais que isso. O economista Guilherme Mello é um dos que apontam que o fato de o crescimento ter se concentrado na agricultura e nas exportações mostra a fragilidade da expansão da atividade, mais atrelada à boa safra e aos preços internacionais de commodities que à política econômica de Temer.
“A queda expressiva dos investimentos e a recorrente retração do consumo das famílias apontam para uma perspectiva nada animadora para o crescimento nos próximos trimestres, uma vez que a demanda continua se retraindo, apesar da rápida desaceleração da inflação”, escreveu Mello, em recente artigo no Jornal dos Economistas.
A queda da inflação, aliás, considerada pelo governo e pelos parlamentares aliados de Temer como uma conquista do governo também precisa ser analisada com maior cuidado. Ela é resultado, na verdade, da depressão vivenciada pelo país. Em junho, o Brasil chegou a ter sua primeira deflação (o contrário da inflação: queda nos preços) desde junho de 2006. Trata-se de um símbolo da perda de vitalidade da economia. Os altos índices de desemprego fizeram com que o consume caísse, derrubando, portanto, os preços. Ou seja, nada a ser comemorado.
Outro item mencionado pelos deputados como ação positiva do governo, a redução da taxa de juros de fato tem acontecido, mas em um ritmo muito inferior ao exigido pelo atual momento – em especial ao levar-se em conta a velocidade da queda da inflação. Esse descompasso faz com que tenha sido muito tímida a redução da taxa de juros real (descontada a inflação), que se mantém como uma das mais elevadas do mundo, atrapalhando a retomada do crescimento.
O governo, que assumiu sob a bandeira única do equilíbrio fiscal, tem colecionado fracassos econômicos. A ausência de medidas que possam efetivamente melhorar a atividade se refletiu na queda drástica da arrecadação e deve impedir, inclusive, o cumprimento da meta fiscal de 2017. Sem conseguir fechar essa conta, a gestão já sinalizou que analisa a possibilidade de revisar a estimativa, aumentando o déficit.
Responsável também por aprovar iniciativas como a reforma trabalhista, a gestão Temer aposta no ataque aos direitos dos trabalhadores, na redução dos benefícios sociais e dos investimentos. Atua, portanto, no sentido da aniquilação do mercado interno e das capacidades do Estado de atuar e prol da recuperação.
Fica difícil, portanto, compreender as falas dos parlamentares que alegaram preocupação com economia, ao votarem pelo arquivamento da denúncia contra Temer. Tão coerente quanto os discursos daqueles que votaram pelo impeachment de Dilma Rousseff, justificando necessidade de combater a corrupção, mas empossaram em seu lugar este governo que trocou votos por emendas parlamentares, para se salvar de uma denúncia de… corrupção.
Portal Vermelho
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