Por Walter Sorrentino*
Mas, vejamos o “custo” da solução de Temer. Um governo alcançado fora da legalidade e sem legitimidade, para deixar de ser interino, precisa antes de tudo aprovar o impeachment. Depois, serão outros quinhentos.
Para aprovar o impeachment, faz-se um governo “congressual”, ou seja, paga-se o botim ao malfadado Centrão; e a política econômica fica blindada, à margem da crise política, esta que era a segunda perna de união entre os golpistas, sendo a primeira o compromisso de derrubar Dilma.
De imediato, uma conta é simples. Aprovou-se um deficit fiscal de R$ 170 bilhões. E aprovou-se um teto para gastos do Estado, mais uma regra que limita seu crescimento por vinte pretendidos anos! Isso feito por um governo interino, uma aventura irresponsável com a nação.
A mídia plutocrática saudou como “transparência” essa irresponsabilidade de engrossar o deficit para comprar o essencial: Temer deixar de ser interino. Sabia-se que o consórcio golpista daria uma moratória ao governo, uma espécie de lua de mel, só não era evidente o tamanho do cinismo.
Com esse deficit, deram bondosamente perto de R$ 60 bilhões para aumento dos servidores públicos, em especial do Judiciário (!). Depois, um acordo com governadores, ao custo de R$ 50 bilhões. Mais uma pequena ajuda de emergência de R$ 3 bi ao Rio de Janeiro em estado de calamidade. Sem falar na autorização das emendas parlamentares, mais alguns bilhões. Tudo partes da regra, mas contradizem o rigor fiscal.
Quer dizer, são R$ 170 bilhões de imediato, por assim dizer, para comprar a aprovação do impeachment. Estava precificado, como se diz no jargão estúpido do senhor mercado.
Afinal, derrubar Dilma e tentar desmontar 14 anos de avanços de um projeto democrático e de interesse nacional e popular, não tem preço. Para a plutocracia, vale qualquer preço mudar a Constituição quanto aos deveres do Estado e direitos do cidadão. Meirelles declara: “Ou mudamos a Constituição, ou não resolvemos a dívida”, a malfadada falácia de que o Estado não cabe no PIB.
Como disse, depois serão outros quinhentos. Aprovado o impeachment, vem na esteira a reforma da Previdência – não uma reforma em defesa da Previdência, mas em desfavor dos trabalhadores. Mais: no fim do arco-íris há um pote de ouro. Nele estão as desnacionalizações e privatizações, o regime de partilha do pré-sal e muito mais bondades contra o interesse nacional – ontem mesmo se aprovou autorização para aéreas com 100% de capital estrangeiro, imaginem os interesses envolvidos! Aliás, esta é a parte do botim disputada a tacape entre tucanos e peemedebistas.
Isso tudo serve, mais uma vez, para compreender algumas coisas. Primeiro, não se enganar quanto à real correlação de forças que abriu caminho para pôr o país na marcha da regressão nacional e de direitos sociais de modo violento. É um quadro que impõe ao campo democrático, progressista e popular uma situação de defensiva e resistência, mas acumulando forças na luta se for hábil, firme e amplo.
Segundo, não desprezar a crueldade e sagacidade das forças do governo interino para fazer o “serviço sujo” que limpa o terreno onde se semeará a regressão. As mesmas características que estarão presentes quando elas se contrapuserem entre si, motivadas pelas inúmeras contradições do consórcio golpista. Vão tirar Cunha da cena do crime… Podem mesmo chegar a substituir Temer, se for necessário, depois da “prestação de serviços” contratada, mediante, por exemplo, eleições indiretas.
Terceiro, mais que tudo, dar à luta de resistência ao golpe e ao governo ilegal e ilegítimo com seu programa ultraliberal uma perspectiva política, propor saídas políticas que se sobreponham a qualquer pacto das elites. Sem isso não há desfecho para a crise, ela se prolonga até 2018. Deixar o país sangrar até 2018, como se quanto pior para o país melhor para a oposição popular, seria uma irresponsabilidade, nem sequer discutível – explicitaria a falta de opção de nossas forças. O mais fundamental será a esquerda política e social, as forças democráticas e progressistas, protagonizarem a luta por essa perspectiva, para reconquistar a confiança da real maioria do povo trabalhador.
Há aceso debate sobre saídas possíveis na esquerda, nas forças progressistas, na sociedade. Dilma mostrou ter apreço e aceitar uma que vai se fazendo de crescente apelo: antecipar eleições diretas se o povo assim o decidir em um plebiscito convocado para esse fim. O trabalho de consenso em torno disso vai se lavrando e pode representar a bandeira que vai mais à mente e coração das massas, à compreensão da maioria do povo: Fora Temer, e remeter as saídas que deem desfecho à crise política a um mandato presidencial confirmado pela força do voto popular, para que não fique refém de um sistema político que já passou, há muito, do ponto de fadiga.
*Walter Sorrentino é médico e vice-presidente nacional do PCdoB
Portal Vermelho
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