Agência Câmara
Cunha é acusado de ter mentido na CPI da Petrobras quando negou que seja detentor de contas no exterior. As outras acusações que pesam sobre ele, como recebimento de propina e lavagem de dinheiro desviado da Petrobras, só para citar os mais recentes, não fazem parte da acusação. Cunha fez questão de declarar, logo no início da sessão, que não responderia sobre esses casos.
Os debates que se seguiram a fala do Eduardo Cunha foi dividida entre a tropa de choque dele, que defendeu o parlamentar, fazendo acusações aos seus desafetos e críticas as atitudes do Supremo Tribunal Federal (STF), que o afastou do cargo, como foi o caso do deputado Carlos Marun (PMDB-MS); os ex-aliados e que hoje querem passar como opositores de Cunha, pedindo a sua reúnica, como foi o caso do deputado tucano Nelson Marchezan Jr. (RS); e os acusadores, como o deputado Chico Alencar (RJ), do Psol, que fez a representação contra Cunha no Conselho de Ética.
Alencar iniciou sua fala lembrando que o Código de Ética da Câmara, em seu artigo 4 inciso 5 diz que “Constituem procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato: omitir intencionalmente informação relevante.”
E continuou: “Consideramos absolutamente relevante tudo o que se tem dito aqui inclusive com relação ao truste.” Truste (em inglês trust) significa a custódia e administração de bens, interesses ou valores de terceiros. Trata-se de qualquer tipo de negócio jurídico que consista na entrega de um bem ou um valor a uma pessoa (fiduciário) para que seja administrado em favor do depositante ou de outra pessoa por ele indicada (beneficiário).
Alencar ironizou a fala de Cunha, destacando que “quando se diz que bens nos chega sob a benção de Deus, há uma mudança na frase dos dólares que aqui vale ‘In trust we trust’”. O trocadilho de Alencar considera a frase impressa nas cédulas de dólar que diz “In god we trust”, que significa “Em Deus nos cremos.”
Ironias à parte, Alencar citou o texto do advogado, professor da USP e vice-presidente da International Fiscal Association, Heleno Torres, que diz que não há qualquer dúvida sobre a obrigação do “Certus trust” (administrador de truste) de declaração de bens e recursos junto ao Banco Central do Brasil e a Receita Federal.
E citou ainda o parecer do Banco Central que é taxativo nesse caso: “Os bens, direitos e valores de qualquer natureza existentes fora do território nacional e não declarados ao Banco Central encontravam-se vinculados economicamente e judicialmente ao senhor Eduardo Cunha estando este apto a exercer sobre ele poder, controle, gestão e disponibilidade, bem como direitos, pretensões, ações de natureza pessoal e real.”
Baseado nessas premissas, o deputado lembrou que Cunha havia dito na CPI da Petrobras não ter nenhum tipo de conta no exterior e que só admitiu a existência do truste tempos depois da oitiva da CPI.
Manobras iniciais
Logo no início da sessão, Cunha e seus aliados tentaram manobras para protelar ainda mais o julgamento, que termina hoje com a oitiva dele. O deputado Carlos Marun pediu pedido o afastamento do presidente do colegiado, deputado José Carlos Araújo (PR-BA), que foi negado pelo 1º vice-presidente, deputado Sandro Alex (PSD-PR).
Marun ressuscitou uma velha queixa de que Araújo não podia presidir o colegiado porque havia adiantado sua opinião sobre o caso. E disse que recorrerá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) contra a decisão de Sandro Alex. A CCJ é agora presidida por outro aliado de Cunha, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), que ocupa o cargo com o apadrinhamento do presidente da Câmara que, mesmo afastado do cargo, continua a ter influência sobre os trabalhos legislativos.
Em seguida, o próprio Cunha pediu a impugnação do relator do processo no Conselho de Ética, deputado Marcos Rogério (RO), com o argumento de que ele mudou de partido, passando ao Democratas (DEM), que integra o mesmo bloco do PMDB de Cunha.
O presidente do Conselho de Ética respondeu que Cunha ainda não tinha feito a arguição e, quando fizesse, haveria uma resposta sobre uma possível mudança de relator. “Isso será objeto de preliminar por mim arguida na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ)”, disse Cunha, seguindo o exemplo do aliado de apelar para a CCJ em suas tentativas de manobra.
Último dia
A audiência dessa quinta-feira é o último dia da fase de instrução do processo, que começou em outubro do ano passado e, após várias e insistentes manobras de Cunha para suspendê-la e atrasá-la, tendo lhe valido o afastamento pelo STF do cargo de deputado e consequentemente de presidente da Casa, parece chegar ao fim.
Se não houver mais nenhuma manobra do presidente afastado, após a quinta-feira o relator da matéria terá dez dias para elaborar o parecer que será votado no Conselho.
O presidente do colegiado disse, esta semana, que não se surpreenderá se Cunha tentar mais uma manobra, já que vem retardando o processo há mais de cinco meses. “Semana passada, eles (apoiadores de Cunha) tentaram mais uma manobra. Entraram com uma questão de ordem argumentando que, como o mandato de Cunha estava suspenso, a ação dele deveria ser trancada. Respondemos que não podia, pois quando há processo aberto, ele deve continuar mesmo se o parlamentar renunciar. Estamos respaldados pela Constituição, pelo regimento do Conselho e pela resposta que o ministro Teori Zavascki deu ao mandado de segurança que entraram contra mim”, disse Araújo.
E destacou que as manobras de Cunha são “inúteis” e já avisou que se o relatório não for aprovado no Conselho, ele vai recorrer, e o caso será votado em plenário. “Acredito que no plenário ele perde. Quem votar nele estará se suicidando, politicamente”, comparou.
A sessão, que começou logo depois das 9 horas, prossegue na Câmara.
Portal Vermelho
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