Quando divulgou a conversa ilegalmente grampeada entre Lula e Dilma, o juiz Sergio Moro alegou “interesse público” no assunto. Acrescentou que os governados têm o direito de saber o que fazem (inclusive na intimidade) os governantes. Os mesmos argumentos , e muitos outros, podem ser invocados pela sociedade para exigir a divulgação da “lista da Odebrecht”, contendo mais de 300 nomes de políticos que receberam “capilés” da empreiteira, logo posta sob sigilo por Moro. Por que nela há pessoas “com foro” ou porque ela não atende a seuis critérios de seletividade? Da mesma forma, a sociedade tem direito de exigir do Ministério Público que aceite a proposta da construtora para uma “colaboração definitiva”, afastando a suspeita de que a recusa se relaciona com a amplitude do esquema de financiamento partidário-eleitoral que a Odebrecht planejava desnudar.
O desinteresse de Moro e dos procuradores pelas revelações da construtora transpareceu já na noite de terça-feira, conforme registrou este blog. O Jornal Nacional , ao noticiar a Operação Xepa, que fez buscas e apreensões em várias unidades da Odebrecht, destacou trechos da nota pública da empresa, passando ligeiramente sobre o trecho em que afirma não ter a construtora “responsabilidade dominante” pelos fatos apurados e pela existência de “um sistema ilegítimo e ilegal de financiamento do sistema partidário-eleitoral”. A seguir, William Bonner informa que “nossos repórteres” ouviram do Ministério Público que tal acordo não havia sido assinado e que seria analisado segundo as prioridades da Operação Lava Jato. O desinteresse do Ministério Público confirmou-se nesta quarta-feira logo que começaram a ser divulgados nomes da oposição que figuram na lista da Odebrecht, tais como Aécio Neves, José Serra, Rodrigo Maia e Eduardo Cunha, para ficar só em quatro importantes lanceiros do impeachment. Moro colocou o material sob sigilo e os procuradores praticamente descartaram a delação da Odebrecht.
A sociedade tem o direito de conhecer este “sistema ilegal e ilegítimo” de financiamento do conjunto de partidos que a representa. Quando diz que não tem “responsabilidade dominante” por sua existência, a Odebrecht diz implicitamente que não o criou sozinha, que ele não nasceu agora, nos governos do PT, que ele envolve um conjunto de empresas e partidos, enfim, que este é o sistema político-eleitoral que temos, fomentador da corrupção. A lista contém informações que remontam aos anos 1980. Se o objetivo é passar o país a limpo, tal sistema precisa ser conhecido para ser desmontado e substituído. Moro, em seu já muito citado artigo sobre a Operação Mãos Limpas da Itália, refere-se à necessidade de “deslegitimação” do sistema partidário que lá estava fortemente associado à corrupção. Já a Lava Jato parece querer deslegitimar apenas uma parte do sistema partidário, composta pelo PT e partidos aliados.
A divulgação da lista iluminaria uma parte do porão. Mas a “colaboração definitiva”, expressão cunhada pela Odebrecht para indicar a disposição de seus dirigentes de falar tudo o que sabem, e certamente sobre todos, é fundamental para o completo desvelamento do esquema. Na colaboração eles não apenas citariam nomes mas apontariam mecanismos operacionais ainda não de todo conhecidos. A parte ainda lúcida da sociedade, que não se deixou cegar pelo ódio, que mesmo não gostando do PT percebe a seletividade do processo, tem o direito de conhecer a lista e as revelações da Odebrecht. Depois do desgaste com as ilegalidades cometidas contra Lula, Dilma e outros políticos grampeados, a Lava Jato faria bem em afastar as evidências de que seu propósito não é uma faxina mas sim uma chacina política.
Brasil 247 – Blog Tereza Cruvinel
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