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Persona : Grata!

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Gente boa do Blog, no dia 28 de março, sábado atrasado, faleceu em Catalão, dona Waldete de 94 anos, mãe do grande amigo Claudinho, o conhecido Cacá Lúcio e de mais 09 filhos. Há 05 anos atrás escrevi um breve texto sobre ela, por considerá-la uma guerreira, vencedora e uma pessoa digna de reconhecimento por toda história de luta, desafios e superações.

Somente hoje tive tempo de procurar e achar o texto, o qual divido com vocês, em seu velório, me chamou à atenção a forma serena com que estava, vestida de rosa, parecia uma criança descansando de uma longa jornada de vida. Fica a  todos nós, em especial a quem teve o prazer de conhecê-la, a lembrança e o exemplo de vida nos guiarão.

Persona :  Grata!

 

 
Dona Waldete, a “velha” guerreira!

Ela nasceu em 1921, ano em que o Brasil era governado por  Washington Luís  , o Estado de Goiás era ainda uma província e Catalão vivia uma verdadeira guerra provincial protagonizada por representantes do coronelismo regional. Quem vê a hoje frágil dona Waldete, de pouco mais que um metro e 40 centímetros de altura, não sonha  com a história de vida e de superação vivida por aquela mulher.

No rosto as marcas estão por toda a parte, a pele enrugada é testemunha ocular que os 89 anos ali passados foram de muito trabalho e luta impostos por um viver dedicado a família, ela é mãe de 10 filhos, todos ainda vivos e fortes, e o maior orgulho da anciã é o fato de que nenhum virou bandido,roubou, matou ou se perdeu na vida. Viúva aos 47 anos de idade, sozinha teve que criar, ensinar e preparar para a vida, as 05 filhas mulher e os 05 homens o mais novo estava apenas com 02 anos de idade, quando o pai se foi, naquele momento havia sido vitimado por paralisia infantil, o irmão mais próximo tinha o  lábio laporino e necessitava de uma cirurgia tão difícil naqueles tempos, ainda restavam para serem sustentados pelas mãos fortes da pequena viúva, Maria das Graças, Das Dores, do Rosário, de Lourdes e Rita de Cássia, além das 05 Marias, balançavam no berço, Francisco de Assis, Aparício, Waldemar, Elismar e Cláudio.

Hoje quem vê dona Waldete e se interessa em ouvir suas histórias, pode apostar que irá ter dificuldades em segurar as lágrimas, são histórias de luta e de desafios vencidos por uma frágil mulher fisicamente, contudo, muito disposta ao trabalho e resignada a vencer obstáculos e a dar o sustento a numerosa família.

Ela mora há décadas no mesmo lugar, atualmente ao lado de três filhos, e de uma filha, em um local  praticamente no centro da cidade, a modesta casa, já esteve ao lado de um antigo cemitério e em frente ao famoso prostíbulo da também famosa Maria Fernandes, cafetã contumaz em servir os ricos da época e a iniciar no mundo dos prazeres os jovens filhos de coronéis de meio do século passado e outros que pudessem pagar alguns contos de réis.

Ela diz que adora o lugar onde mora hoje, mas puxa na memória uma época em que a chuva derrubou o barraco de dois cômodos  em que morava com o marido e sete filhos, as paredes e o telhado foram derrubados, todos tiveram que no meio da noite e sobre forte temporal largar tudo e ir se esconderem a poucos metros do cemitério, do marido Joaquim, natural de Estrela do Sul, além das proles que ficaram para ela cuidar, as lembranças não são as melhores possíveis, ele já foi sapateiro, comerciante e “catireiro”, adorava fazer negócios, mas o problema  é que sempre andava para trás, a cada negociação mais perdas, até que o terreno de mais de 15 lotes acabou restando apenas um, que ainda se tornou meio por negócios mal resolvidos e pela   esperteza de alguns, mesmo assim, foi ali mesmo que ela conseguiu construir uma simples casa para abrigar a todos os filhos e aos sonhos da vida

Lamenta não poder ter em  casa muitas plantas e flores pois adora mexer com a terra, podar plantas e cultivá-las,  chegou a ser obrigada a cortar dois pés de manga, porque os vizinhos não suportavam frutos maduros caindo e nem folhas, a natureza não escolhe onde festejar a beleza da vida, mas a intolerância sempre fala mais auto, deve ser o progresso.

Mas ela não gosta de falar sobre isto, os problemas de convivência com os vizinhos são fatos do passado, ela não quer revivê-los ao lado dos 16 gatos que possui, uma mulata, dois periquitos e um cachorro, a velha senhora não se conforma mesmo é com o fato de não poder caminhar tranquilamente nesse momento, pois sofrera uma queda e acabou por fraturar a costela, ela sofre de osteoporose e a cada queda é uma parte dela que se quebra, além da paixão pelos gatos, herdada da mãe que tinha mais de vinte, e cultivada por toda a família, ela adora ler, e pasmem mesmo tendo frequentado apenas até o quarto ano primário, ainda lê jornais e revistas, tem guardado exemplares de 50 anos atrás, lê diariamente a bíblia, segundo ela apenas três filhos não gostam de ler,os demais devoram uma biblioteca inteira em pouco tempo, ao meio da ninhada de gatos que observam tudo roçando nas pernas dos leitores.

Voltando ao assunto do marido, ela explica porque nunca quis se casar de novo ou arrumar outro namorado, “Gato escaldado  tem medo de água fria”, e diz mais, a gente não pode caçar sarna para coçar com as próprias mãos, e padrasto é só para judiar dos filhos da gente. O dia de dona Waldete começa cedo bem cedo, ela tem o costume de acordar as 05:30 da manhã, imediatamente liga o companheiro de jornada, o velho  rádio philips a pilha que lhe informa do que está acontecendo em Catalão e no mundo e só volta a dormir lá pelas 22:00 horas, após ver mais um capítulo da novela.

Tem nelas um grande passatempo, mas reclama que as boas eram as de antigamente, cita a Cabocla  como uma das melhores que já assistira, mas se lembra das da antiga Rede Tupi de Televisão e de alguns programas memoráveis, eram histórias boas, hoje não , só se vê coisa mal, imoral, que não prestam para nada.

Em outros tempos gostava de ir ao Cine Real assistir os filmes do imortal Mazzaropi, artista que ela é fâ até os dias atuais.
Sem pensão alimentícia e nem aposentadoria, a velha guerreira foi levando a vida e cuidando dos filhos, para se juntar ao pequeno salário que recebia como merendeira de colégio, ela descascava figo, laranja da terra, ralava mamão, fazia tapetes artesanais e fazia sabão de “bico’ para baratear as despesas do dia a dia.

Ainda hoje a quase centenária  não consegue de parar de tecer e muito menos de costurar, ela é uma exímia colocadora de linha no buraco da agulha, faz da primeira vez o que mesmo os jovens só conseguem após várias tentativas, mas os olhos lacrimejam por ver que atualmente ela não mais pode caminhar tranquilamente.
A patriarca, nunca reuniu os dez filhos em uma mesma ocasião, uma está em São Paulo, outra em Goiânia, outro em Luziânia e os demais aqui em Catalão, mas não é possível reuni-los, lamenta ela, que confirma que sente muitas saudades de todos, Como queria um natal, um ano novo com todos juntos, cada um segue seu destino, salienta.

O mais velho dos homens, que tem nome de santo em homenagem a um de seus devotos, foi injustiçado e carrega até hoje um complexo, quando ainda era adolescente, levado por um amigo, ajudou a falsificar uma assinatura em um talão de cheques, ficou um dia e uma noite preso, e praticamente quatro anos sem sair de casa, trancado em um quarto, em um exílio particular por vergonha de todos, hoje ele é um bancário do Banco do Brasil, profundo conhecedor de outras línguas, mas que não vem a Catalão e raramente liga para ver se está tudo bem.

Ela não esconde que queria vê-los  juntos, mas não é possível, seja o que Deus quiser, o telefone, o controle remoto e a calculadora são inimigos mortais, lembra nossa anfitriã que uma vez quando falava ao telefone, uma senhora desligou o telefone na cara dela, prometeu nunca mais atender um e não o fez., nem mesmo quando de 05 em 05 anos o filho liga. Outro caso envolvendo um dos filhos ocorreu com o caçula, que começava na carreira de locutor de comícios, por problemas da política partidária um sobrinho o chamou de vagabundo, a palavra serviu para que ela nunca mais olhasse em direção ao sobrinho e muito menos falasse com ele.

Católica fervorosa, sempre gosta de ir as missas aos domingos pela manhã , a feira de domingo de terça e de sexta feira, hábitos cotidianos que foram suprimidos no momento, pela doença que lhe acomete, em seu quarto, além do velho rádio a pilha,dos mais de 10 gatos, dezenas de santos lhe observam descansar. Que Deus devolva a ela a força suficiente para ver que cumpriu com maestria seu destino e que sua história de vida é um exemplo para todos nós.

Blog do Mamede

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