Os dois líderes mais emblemáticos de PT e PSDB, ex-presidentes Lula e Fernando Henrique, já deixaram correr, nos tempos do governo do primeiro, a conjectura de que, um dia, no futuro, os dois partidos poderiam se fundir num só. Eram tempos em que, a partir da base do plano Real de FHC e com o impulso de taxas mais altas de crescimento obtidas na gestão Lula, os petistas estavam em alta e os tucanos se debatiam contra a síndrome de se tornarem uma legenda de expressão apenas regional. O assunto ganhou certo corpo em conversas entre parlamentares no Congresso, mas, como se sabe, nunca prosperou.
Naqueles debates informais, o argumento que unia os contrários era o de que não havia diferenças de fundo ideológico entre os dois partidos, mas sim uma distinção de acento sobre os compromissos de cada um deles sobre a necessidade igualmente reconhecida de mudar o Brasil. Nem PT nem PSDB, afinal, haviam nascido para fazer a chamada revolução brasileira. A intenção de ambos, declarada em todos os momentos de suas respectivas histórias, seria de reformar o País.
Agora, a moda é a de apontar o PT como o partido do Brasil pobre e atraso e o PSDB como a legenda identificada com a parte mais rica e inteligente da Nação. Na abertura deste segundo turno da eleição presidencial, Fernando Henrique tornou-se o principal porta-voz desta tese, ao difundir, em entrevista, a ideia de que o voto petista sai do cidadão menos informado e de menor renda (leia maisaqui). Os tucanos, por essa ótica, deteriam o voto mais consciente do brasileiro que conseguiu tomar o elevador da ascensão social e se estabelecer nos andares mais altos.
Dessa diferença de localização na pirâmide social para o estabelecimento de um renovado Fla X Flu ideológico a distância vai se mostrando bem menor do que a que existia na fase em que os caciques deixavam a correr soltas as chances de uma fusão partidária.
Registre-se: nada pode ser pior para os dois partidos do que a imposição dessa lógica de distinção absoluta entre eles. A prevalecer, ela irá somar para que as diferenças programáticas entre eles virem abismos de visão de País. Na prática, acirra as contradições a ponto de impedir que um time reconheça as qualidades do outro, focando apenas nos defeitos alheios. O trabalho de um corresponderá ao boicote do outro.
Divisionismo
Levada para as ruas, essa divisão entre um partido do bem e outro do mal, uma legenda dos ricos e outra dos pobres, uma agremiação que defende os interesses do Sul e do Sudeste e outra que representa o Nordeste e o Norte vai apenas contribuir para um racha definitivo na sociedade brasileira, como chegou a propor um colunista social pró-Aécio, nas redes sociais (leia mais aqui).
O risco não é pequeno, haja visto o que já ocorre em países vizinhos, nos quais a chamada elite pensante se dissociou completamente da reconhecida base operante. O maior exemplo dos males dessa dicotomia reside na Venezuela da Nicolás Maduro.
O caminho brasileiro, quando derivou radicalmente para o racha social, implicou em rupturas institucionais. No ‘nós’ contra ‘eles’ todos perdemos, como se constatou nos resultados nefastos, tanto para economia quanto, especialmente, para a liberdades democráticas, nas perdas gerais provocadas pelo regime militar (1964-1985). Basta olhar aquele período histórico, ainda tão presente na memória de muitos, mas quase inexistente para tantos outros, mais jovens, para se saber onde essa conversa de brancos bem nascidos de um lado e mulatos desfavorecidos de outros, mais instruídos nessa fila e ignorantes por aquela porta pode descambar. Quando o Brasil se deixou levar por essa falsa dicotomia, entrou por um labirinto que precisou de 21 anos para ser ultrapassado. Só faltava termos chegado até aqui para, a esta altura do campeonato, cometermos os mesmos erros.
Brasil 247
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